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Keanu Reeves mata em nome da vingança no sensacional De Volta ao Jogo

Roberto Sadovski

27/11/2014 05h17

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Nem o mais habilidoso dos oráculos saberia dizer como Keanu Reeves foi acertar em cheio de tantas maneiras com este De Volta ao Jogo. Um filme de ação decididamente nostálgico, no sentido que ele não faria feio se chegasse aos cinemas entre os Máquina Mortífera e os Duro de Matar da vida, a aventura do estreante Chad Stahelski, em parceria com David Leitch (eles dividem produção e direção, embora cada um fique com um dos créditos), traz um fiapo de plot e uma desculpa para executar (sem trocadilho) um jogo de vingança que não tem a menor vergonha em ser exatamente o que ele é: um filme de ação esperto, estiloso, violento e ridiculamente divertido.

A trama é absurda de tão simples, sendo apresentada em menos de meia hora. Logo descobrimos que John Wick (Keanu Reeves) amava sua mulher, e esteve com ela até que o câncer a levasse. Logo descobrimos que John Wick não era flor que se cheire, já que no funeral ele tem um diálogo incômodo com um colega de profissão (Willem Dafoe), que lhe assegura que só foi lhe prestar condolências. Logo descobrimos que John Wick não vai estar sozinho, já que sua mulher lhe deixa um filhote de beagle e um bilhete dizendo que ele "precisa de alguém para amar". Logo descobrimos que John Wick não tem o Tico e o Teco em sintonia, já que ele leva o filhote para passear em seu muscle car testando seus limites em uma pista de aviação. E logo descobrimos que John Wick vai "voltar ao jogo" quando o moleque com pinta de mafioso que quis comprar sua máquina invade sua casa após sua recusa, espanca-o, rouba seu carro e mata seu cachorro.

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Você gosta de filhotes? Ih, pode começar a chorar…

"Você roubou o carro de John Wick", diz o atravessador interpretado por John Leguizamo, dando a entender que o passado vai voltar com tudo. Uma cadeia de ligações vai colocar o personagem de Keanu em rota de colisão com o pai do tal moleque, um chefão da máfia russa (Michael Nyqyist) que logo vê seu império em perigo por ter perturbado "aquele que chamamos quando queremos o bicho papão morto". É tanto clichê, tanta frase feita e tanto absurdo que, quando Wick pega uma marreta para abrir o cofre com suas armas escondido em seu porão, não tem como não esfregar as mãos, ir para a ponta da poltrona e aproveitar o passeio.

Stahelski, dublê de Reeves em Matrix, e com uma longa carreira como coreógrafo de artes marciais e coordenador de dublês em filmes como V de Vingança, Os Mercenários, e Wolverine Imortal, revela-se um contador de histórias habilidoso, deixando a narrativa fluida para que o público jamais tenha tempo de questionar a lógica do que surge em cena. Ele e Leitch são capazes de criar um mundo de faz de conta em que assassinos se reúnem em um hotel estiloso (com um pacto de não agressão) e a polícia é não-existente. Tudo para limpar o terreno para sua especialidade: a ação em De Volta ao Jogo é fluida, dinâmica e salta de cena em cena com elegância. Keanu assumiu boa parte da coreografia e, aos 50 anos, dá um banho em muito moleque metido a ser astro de ação (Taylor Lautner veio, foi e não deixou saudades). Sem falar que John Wick é o personagem perfeito para seu rosto impávido – dá para contar nos dedos de uma mão quando ele deixa transparecer alguma emoção.

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ô patrão, tava olhando o carro aí, tá beleza, sem riscado nem nada… arruma um troco aí…

A última vez que Keanu Reeves se aventurou em um filme de maior apelo foi em 2008, com o malfadado O Dia em Que a Terra Parou. De lá para cá ele foi ator em algumas dramas independentes, produziu o documentário Lado a Lado, sobre cinema digital, dirigiu o interessante Homem de Tai Chi e encabeçou o caríssimo e fracassado 47 Ronins – um filme que só funciona se você tiver 12 anos de idade e gostar de tudo que tenha a palavra "ninja". De Volta ao Jogo estreou sem maiores pretensões (é um filme barato, 20 milhões de dólares) e já mordeu 60 milhões em todo o mundo. Merece uma continuação, de preferência com o mesmo espírito nostálgico, mesma atitude sem frescuras e mais capangas para levar tiros no rosto. O que, aqui, acontece aos baldes.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.