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O Rei do Mundo em 1985 tinha um nome... e ele era Sylvester Stallone

Roberto Sadovski

22/05/2015 03h31

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Sylvester Stallone hoje é o retrato do astro velho. Não biologicamente (o que é óbvio, já que ele já está perto de somar 69 primaveras), mas nas ideias. Basicamente ele hoje vive de regurgitar o passado, agregando os companheiros de outrora na série Os Mercenários. Trinta anos atrás, porém, Sly era o inequívoco Rei do Mundo: se De Volta Para o Futuro ganhou o topo do pódio na corrida pelas maiores bilheterias de 1985, o astro ficou com a prata e com o bronze. Rambo II: A Missão (que estreou há exatas três décadas hoje) e Rocky IV cavaram espaço indelével no inconsciente coletivo, fazendo do ator e diretor uma mina de ouro – capital que, inexplicavelmente, ele deixou escorrer pelo ralo nos anos seguintes.

Rambo II: A Missão foi um movimento calculado. O primeiro filme, Rambo: Programado Para Matar, foi lançado em 1982 como um drama de guerra que lidava com um problema sério: a rejeição dos veteranos da Guerra do Vietnã ao voltar para casa. Longe de ser uma aventura com tiros e explosões, o filme de Ted Kotcheff explorava mais os talentos dramáticos de Stallone (sim, acredite, ele os tem) do que seus músculos. O final original de Rambo, por sinal, seguia o livro de David Morrell, com o ex-soldado cometendo suicídio. Sly obviamente tinha outros planos. Tendo experimentado o sabor do sucesso que vem atrelado a uma "franquia" (ele já havia soltado três Rocky quando abraçou Rambo), ele usou seu star power para transformar o destino da máquina de combate humana, que terminou em uma prisão.

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Rambo se tornou mania mundial em 1985

Corta para alguns anos depois. Um jovem escritor chamado James Cameron entrega o roteiro chamado First Blood II: The Mission para o diretor George Pan Cosmatos. O Vietnã já é uma lembrança cada vez mais distante em uma América que vive os anos Reagan e a Guerra Fria em seu auge. A ideia de ampliar o escopo do tratamento indigno dado aos veteranos era traduzida em um script que colocava Rambo em uma missão de resgate, buscando veteranos ainda presos no Sudeste Asiático, uma década após o fim do conflito. Stallone deu um tapa na história e Rambo, como o mundo conhece, nasceu. Com a trilha épica de Jerry Goldsmith, ele se tornou um exército de um homem só, usando armas e vestimentas que se tornaram icônicas em um filme que representou o respiro de uma sociedade que buscava uma válvula de escape contra a nova "ameaça comunista" – os vilões, sem fazer o menor sentido, eram russos.

Para ser honesto, Rambo II: A Missão, não é nem de longe um bom filme. É competente, tem uma coreografia de ação afinada, as locações no México não comprometem. O principal: Stallone entendeu qual seria seu papel como o retrato do novo astro da pancadaria no cinema e caprichou na preparação, deixando o físico forte e explosivo, tão letal quanto a dezena de armas que ele usa para despachar inimigos às dúzias. Só para comparar, a contagem de corpos em Programado Para Matar é de um único policial, que morre por sua própria mão! Não importa. O filme (e o personagem) se tornaram mania mundial, empurrando a bilheteria para inacreditáveis 300 milhões de dólares em todo o mundo. Stallone era, definitivamente, o maior astro do planeta.

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Rocky dá um sopapo na napa de Drago para o delírio do povaréu

Mas ele queria mais. Em 27 de novembro, Stallone retomou seu outro personagem emblemático em um filme que só passa por "filme" em teoria. Rocky IV é o irmão espiritual de Rambo II: A Missão, abraçando sem a menor vergonha o conflito da Guerra Fria, colocando os americanos (no caso, o próprio) como atletas esforçados, que se sensibilizam com a morte dos amigos, treinam duro em condições adversas e colocam pátria e família acima de ganhos pessoais. Já os russos, representados pelo gigantesco Ivan Drago de Dolph Lundgren, eram o oposto: máquinas de matar frias e insensíveis, um homem transformado no atleta perfeito com a ajuda de esteróides e tecnologia. Ou seja, o vilão perfeito.

Perfeito até demais, por sinal. Como Stallone (que assumiu pela terceira vez a direção de um Rocky) queria as lutas mais realistas já captadas em filme, ele orientou Lundgren a sentar o braço – o que ele fez. O resultado foi uma pancada explosiva no peito de Stallone, um inchaço no coração, filmagens reduzidas e um longa reduzido a ligeiros 91 minutos, com praticamente metade tomados por montagens de treinamento embalados por um rock sem vergonha. Mas Stallone era imbatível em 1985, e este video clipe anabolizado também terminou sua carreira com 300 milhões de dólares em caixa. A tradução para linguagem hollywoodiana era: este homem pode fazer o que bem entender, os cofres estarão sempre abertos.

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Herói americano só treina na raça!

E foi a última vez que Sly teve números tão expressivos. Ele escolheu rodar o policial Cobra no lugar de Um Tira da Pesada e o público meio que deu de ombros. O sub-Rocky com braço de ferro, Falcão: O Campeão dos Campeões (pelo qual recebeu absurdos, à época, 5 milhões de dólares), flopou – assim como o drama Condenação Brutal. Rambo III e Rocky V vieram em seguida e foram igualmente ignorados – bem como os anos em que Sly acreditou ser um comediante… O bom filme de ação Risco Total, de 1993, foi um respiro de 255 milhões de dólares em todo o mundo, mas Stallone, totalmente fora de sintonia com o que o público pedia, era uma sombra da potência global de 1985.

Nenhuma parceria funcionava nas bilheterias (com Sharon Stone em O Especialista, com Wesley Snipes em O Demolidor, com Antonio Banderas em Assassinos). Nenhuma tentativa de ser levado a sério resultava em afagos da crítica (eu particularmente acho o drama CopLand, de 1997, quase brilhante). Coisas como Driven, Eye See You e Shade ameaçavam jogá-lo no inferno dos filmes feitos direto para vídeo – de onde Steven Seagal, por exemplo, jamais emergiu. Ele só reencontrou sua voz em 2006, com o belo Rocky Balboa, dois anos antes de fazer as pazes (relativas) com o sucesso em Os Mercenários. A continuação da super equipe geriátrica, que escalou Jean-Claude Van Damme como vilão em 2012, terminou sendo sua maior bilheteria global, um golaço de 305 milhões de dólares. Um breve respiro. Mas dificilmente o mundo vai colocar Sylvester Stallone num pedestal de glória como o fez trinta anos atrás, em dose dupla, quando Rambo e Rocky dominaram o cinema.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.