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Menos denso e mais colorido, Apocalipse é o filme mais divertido dos X-Men

Roberto Sadovski

19/05/2016 07h54

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A essa altura, os filmes com super-heróis precisam suar a camisa para não ser apenas mais um no balaio. O senso de descoberta já ficou para trás, ver personagens de gibis traduzidos para o cinema não é mais novidade. Ainda nem chegamos ao meio do ano e X-Men: Apocalipse já é a quarta adaptação de heróis de quadrinhos no cinema, seguindo o rastro do bom (Capitão América: Guerra Civil), do mau (Batman vs Superman: A Origem da Justiça) e do esquisito (Deadpool). A boa notícia é que o diretor Bryan Singer entrega uma boa trama sem perder o nariz para o espetáculo. Apocalipse termina se destacando por abraçar o fantasma do qual a série foge há dezesseis anos: ser, desavergonhadamente, um filme de super-heróis.

Desde o primeiro X-Men, os personagens são retratados em tela grande com diferenças gritantes do que Stan Lee e Jack Kirby colocaram no papel inicialmente em 1963 – seja uniformes, origens e até mesmo poderes. O motivo era simples: o cinemão, ainda na ressaca de Batman & Robin, queria distância de qualquer sugestão que arriscaria mais uma adaptação de gibis. Quando Bryan Singer assumiu o comando do filme dos mutantes, portanto, criou uma ficção científica com grandes temas e pouca extravagância, com personagens quase sempre humanos trajando roupas de combate monocromáticas. Apocalipse, por outro lado, é uma explosão de cores e superpoderes explícitos em escala épica. É como se o diretor tivesse cumprido sua missão em mostrar os temas que definiram a série, como diversidade e preconceito, e quisesse mesmo se divertir.

James McAvoy X-Men

James McAvoy não vai conservar essas madeixas por muito tempo…

Ainda assim, Apocalipse é continuação direta de Primeira Classe (2011) e Dias de Um Futuro Esquecido (2014), saltando mais uma década na narrativa e aterrissando desta vez nos anos 80. É quando o primeiro dos mutantes, En Sabah Nur (Oscar Isaac, perdido sob camadas de maquiagem), que reinou no Egito como um deus imortal, desperta de um sono milenar em um mundo tomado pelos "fracos", com as superpotências globais equilibrando o poder via seus arsenais nucleares. Ele captura Charles Xavier (James McAvoy), o telepata mais poderoso do planeta, como uma chave para a dominação global.

Um grupo de seus alunos – Ciclope (Tye Sheridan), Jean Grey (Sophie Turner) e Noturno (Kodi Smit-McPhee) – parte para o resgate, liderados pelo Fera (Nicholas Hoult) e por Mística (Jennifer Lawrence), que se tornou símbolo da paz de humanos e mutantes mas ainda livra seus irmãos genéticos que sofrem opressão. Na "equipe Apocalipse", outro grupo de mutantes é reunido por En Sabah Nur para garantir o sucesso de seu plano, incluindo Tempestade (Alexandra Shipp), o Anjo (Ben Hardy), Psylocke (Olivia Munn) e Magneto, que renova seu ódio contra a humanidade depois de uma década foragido, seguindo uma tragédia que tomou a vida de sua mulher e filha. Como se não tivesse gente o suficiente, a agente da CIA Moira MacTaggart (Rose Byrne) e o velocista Mercúrio (Evan Peters) também se juntam à trama.

Apocalipse

Os novos mutantes Sophie Turner, Kodie Smit-McPhee e Tye Sheridan

Tanta gente e tantos poderes tem um preço, e Singer usa alguns personagens como bucha de canhão, sem lhes dar o luxo de ter sua personalidade mais desenvolvida. Os fãs dos gibis devem chiar por mais uma vez o Anjo entrar mudo e sair calado (à exemplo do uso do personagem no malquisto O Confronto Final, terceiro filme dos mutantes que Brett Ratner dirigiu em 2006). E Psylocke, a imagem espelhada de sua versão nos gibis, é sub aproveitada como pouco mais de capanga do vilão. O próprio Apocalipse perde seu estatura épica e também seu foco, já que muda o rumo de seu plano sem maiores explicacões lá pelo meio do filme. A verdade é que, em Apocalipse, fica evidente que a série dos heróis mutantes usa sua fonte, as histórias em quadrinhos, como simples guia, uma planta baixa que não precisa ser seguida à risca.

Mesmo assim, Singer não deixa a narrativa se arrastar, e conduz X-Men: Apocalipse como um xadrez bem elaborado, mesmo que algumas peças tenham de ser sacrificadas para que outras possam triunfar. Em pelo menos três momentos, extremamente distintos, o diretor consegue um resultado brilhante. O primeiro é centrado em Michael Fassbender e sua extraordinária habilidade em humanizar um personagem como Magneto. Ao combinar a dor da perda de sua família com a fúria com que ele volta a usar seus poderes, o ator desenha uma complexidade exigida por alguém que não pode ser definido tão simples como herói ou vilão.

Apocalipse

Bryan Singer dirige Michael Fassbender e Alexandra Shipp

O segundo grande momento é catártico, e traz Evan Peters como Mercúrio, expandindo a já antológica sequência em que ele usa sua velocidade em Dias de Um Futuro Esquecido. Aqui, porém, a combinação de coreografia, técnica, efeitos especias que conseguem surpreender, o imenso carisma de Peters e de, acredite, a clássica pérola pop "Sweet Dreams (Are Made of These)", resulta em uma daquelas cenas que dá vontade de aplaudir ao fim. Já o terceiro foi inexplicavelmente estragado pelo último trailer, e merecia ser descoberto somente quando já estivéssemos no cinema. Basta dizer que envolve o único ator presente em todos os filmes da série, uma locação familiar e muito, mas muito sangue.

Coroando a expansão do universo (cinematográfico?) dos X-Men, Apocalipse cumpre com louvor, embora com menos densidade, a função de encerrar mais um capítulo da saga dos mutantes. Singer tem a manha de acenar um futuro sombrio para uma certa telepata/telecinética e cutuca os fãs dos quadrinhos com uma cena pós-créditos que vai fazer os iniciados salivarem de antecipação pelos próximos capítulos. Nem precisava. X-Men: Apocalipse, com cor, som e fúria, sai de cena com o recado bem dado: estamos aqui para ficar.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.