Ideia é mais engraçada que execução no primeiro filme do Porta dos Fundos
O primeiro filme do grupo Porta dos Fundos, Contrato Vitalício, foi anunciado com um imenso ponto de interrogação. De que forma, afinal, o humor da trupe, traduzido em sketches de 2, 3 minutos na internet, ganharia corpo em um longa metragem de quase duas horas? Como o filme seria diferente do oceano de comédias nacionais que entopem os cinemas – e deixam zero lembranças quando as luzes se acendem? A boa notícia é que o filme, dirigido por Ian SBF, traz uma ideia clara de onde quer chegar e tem mais cuidado em contar uma história do que em encaixar gags a esmo. A não tão boa é que falta foco a essa mesma história, com a narrativa central por vezes sacrificada com tramas paralelas que não a fazem caminhar.
Este problema se torna incontornável até por conta do tamanho da trupe. Com os vídeos na internet, é possível enxugar o elenco e contar histórias melhor amarradas. Em seu primeiro filme, e de forma compreensível, todo membro do Porta dos Fundos ganha espaço, e é justamente esse gigantismo que fica no caminho da ideia principal. O resultado são personagens com arcos dramáticos mais completos, dividindo a cena com outros que não conseguem ir além de estereótipos ligeiros – perfeitos em sketches para assistir ao celular no metrô para casa; deslocados em um filme com muitas engrenagens em movimento.
Mesmo assim, Contrato Vitalício acerta no alvo quando escala Fabio Porchat como protagonista. Ele traz uma expressão de pânico constante e total abandono perfeita para encarnar o protagonista, Rodrigo, um ator de sucesso obrigado por um contrato assinado em um guardanapo a fazer um filme com seu parceiro e diretor, Miguel. O problema é que o sujeito, interpretado por Gregorio Duvivier, desapareceu uma década antes (após faturar a Palma de Ouro em Cannes) e ressurge, do nada, contando uma história maluca sobre como foi abduzido por aliens que habitam o centro da Terra, justamente a história que quer contar em seu filme novo.
É o gatilho para Contrato Vitalício mirar a metralhadora em nossa cultura de celebridades, nos famosos emergentes da internet, no trabalho oco da mídia que gravita em torno do famoso da vez. Em suma: é o Porta dos Fundos zoando com seu próprio habitat – o que é ótimo! Seria tentador juntar um punhado de sketches e amarrar tudo em um longa, o que poderia funcionar à perfeição, vide o já clássico As Amazonas na Lua, que Joe Dante e John Landis ajudaram a conduzir em 1987. Mas Porchat, Duvivier e cia. escolheram o caminho menos óbvio, arriscando não converter a enorme audiência online do Porta em ingressos no cinema.
A estratégia, felizmente, funciona. Tudo bem que o texto ainda merecia um cuidado maior para sustentar sua ambição. Exemplo: mesmo dentro da lógica de um filme, que caminha em uma realidade de fantasia, é pedir demais a suspensão da descrença quando um sujeito some por dez anos, volta e ninguém parece muito interessado em saber o que exatamente houve neste hiato. A melhor surpresa é que, apesar de suas engasgadas, Contrato Vitalício surge como cinema, e não como arremedo televisivo despejado em uma plataforma diferente. Abre espaço dentro da comédia brasileira no cinema para um estilo de contar histórias que pode dar novo fôlego a um gênero assolado por uma vida inteira de doutrinação em bordões e humor físico. Mas o Porta dos Fundos ainda está devendo aquela gargalhada caprichada na sala escura.
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