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Will Smith contra Will Smith? Ang Lee como diretor? O que é, afinal, a ficção científica Gemini Man?

Roberto Sadovski

26/04/2017 04h58

Imagine Will Smith no papel de um assassino profissional casca grossa, beirando os 50 anos, que decide não eliminar um alvo por deixar suas emoções calarem seu profissionalismo. Imagine as pessoas que o contrataram, furiosas, decidindo retirá-lo do jogo. Agora imagine que o único capaz de deter o sujeito seja ele mesmo, mas com metade da idade, mais arrogante, mais violento e determinado, no auge de suas habilidades: um clone mais jovem. Imagine o Will Smith da época de Um Maluco no Pedaço caçando o Will Smith visto anteontem em Esquadrão Suicida. Tudo isso com direção de Ang Lee. Basicamente isso é Gemini Man. E é também um dos grandes projetos nunca realizados em Hollywood.

A primeira vez que li sobre Gemini Man, um roteiro escrito por Darren Lemke (que recentemente escreveu o esperto Goosebumps), foi há quase duas décadas. Na virada do milênio, a trama do matador contra seu clone mais jovem caiu nas mãos do produtor Don Murphy, que queria Tony Scott na direção e Mel Gibson como o assassino – algo como o Mad Max original saindo no braço com o protagonista de O Troco. O problema na época foi um só: a tecnologia não existia. Gemini Man passou para a agenda do produtor Jerry Bruckheimer, quase virou filme em 2009 por Curtis Hanson (Los Angeles – Cidade Proibida) e, pouco depois, por Joe Carnahan, diretor de Esquadrão Classe A, que queria Clint Eastwood como o(s) protagonista(s). Ainda assim, não saiu da gaveta.

Achievement in directing, "Life of Pi" (20th Century Fox)<br /> Ang Lee<br /> This image is made available here as part of the Academy of Motion Picture Arts and Sciences' 85th Annual Academy Awards® Nominations Announcement Press Kit. This image may only be used by legitimate members of the press.

Ang Lee (aqui no se de As Aventuras de Pi) é a escolha sensata para Gemini Man

Gemini Man parecia fadado a engrossar a lenda hollywoodiana dos grandes filmes jamais realizados, como Crusade (com Arnold Schwarzenegger como cavaleiro nas cruzadas sob a ótica de Paul Verhoeven), The Sky Is Falling (thriller em que dois seminaristas se tornam serial killers ao descobrir que Deus não existe, passando a ser caçados por um assassino contratado pela Igreja) ou Toon Platoon (híbrido de animação e live action que coloca Roger Rabbit nas trincheiras da Segunda Guerra Mundial). Tirar o projeto da hibernação exigia um diretor com a sensibilidade de injetar motivações reais num personagem com pouco estofo, ao mesmo tempo em que tivesse visão e habilidade com tecnologia de ponta e não testada em algo dessa escala. James Cameron, ao que tudo indica, está com as mãos ocupadas até pelo menos 2025…

Entra em cena Ang Lee. O Hollywood Reporter revelou que o diretor de Hulk, O Segredo de Brokeback Mountain e As Aventuras de Pi está assinando na linha pontilhada com a produtora Skydance para dar nova chance a Gemini Man. Além disso, a publicação também aponta que Will Smith deve assumir o papel do protagonista, o assassino Alex Kane, e de seu clone, Rye (um nome só, tipo Madonna ou Rihana). Talvez seja o time perfeito na época perfeita. Lee revelou-se entusiasta de novas tecnologias, seja lidar com um protagonista digital (o que ele fez em Hulk), seja avançar no uso do 3D (As Aventuras de Pi é, antes de mais nada, uma festa para os sentidos), seja inovar ao filmar com uma frequência maior de quadros por segundo, o que deixa a ilusão de movimento em um filme mais natural (e mais estranha aos olhos, como atestou o fracasso retumbante do drama de guerra A Longa Caminhada de Billy Lynn). Smith, apesar também de alguns escorregões recentes (ninguém se deu o trabalho de ver o insuportável Beleza Oculta), é um dos poucos astros de impacto mundial em atividade.

Você acredita neste sujeito como um assassino implacável? Hmmm…

Mas o grande "astro" aqui é a tecnologia. Em 2000 rejuvenescer um ator era impossível. Em 2006, X-Men: O Confronto Final mostrou que o software estava avançando. Em 2008 Brad Pitt convenceu dos 8 aos 80 em O Curioso Caso de Benjamin Button. Looper navegou por mares semelhantes, mas o diretor Rian Johnson optou por colocar Joseph Gordon Levitt como um Bruce Willis mais jovem usando maquiagem – o que por vezes quebrava a ilusão. Mais recentemente, a Marvel colocou em cena versões digitais mais jovens, e absurdamente convincentes, de Michael Douglas (Homem-Formiga), Robert Downey Jr. (Capitão América: Guerra Civil) e Kurt Russell (Guardiões da Galáxia Vol. 2). E eu nem mencionei a princesa Leia em Rogue One! Gemini Man, ao contrário de todos estes filmes, exigiria um ator rejuvenescido não por cenas breves, e sim por um filme inteiro, levando o limite dessa tecnologia ao máximo. Ainda assim, é um desafio que parece ter o nome de Ang Lee como resposta. Desta vez, o tempo de gestação absurdamente longo de um filme operou a seu favor. Paciência é o nome do jogo.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.