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Andy Serkis: o astro que você nunca enxerga em Planeta dos Macacos: A Guerra

Roberto Sadovski

02/08/2017 05h28

"Pode apostar que já passou da hora!" Andy Serkis se empolga quando o assunto é o reconhecimento de seus pares para a tecnologia de captura de movimento. À frente do uso da ferramenta desde que deu vida a Gollum na trilogia O Senhor dos Anéis, o ator britânico de 53 anos acha que os atores veteranos que votam em premiações como Oscar e Bafta precisa parar de olhar torto quando um ator usa a tecnologia. "Isso é coisa dos membros mais velhos, que ainda não entendem o que é captura de performance", esbraveja Serkis. "Quando o trabalho é feito com maquiagem e próteses, muitos acham ok e enxergam uma interpretação. Basta a tecnologia ser digital, já não levam a sério, acham que é animação. Mas isso vai mudar!"

Com certeza vai mudar, e mais certeza ainda que Andy Serkis estará à frente deste salto. O ator veio ao Brasil para o lançamento do espetacular Planeta dos Macacos: A Guerra, e prova, no filme, por que seu trabalho não só é atuação pura e simples, mas uma performance brilhante, cheia de nuances e digna, óbvio, de aplausos e reconhecimento. Não que Serkis precise de uma estatueta dourada para consolidar o que os fãs de cinema já sabem: ele é um ator completo, de alcance infinito, capaz de dar vida a personagens que fogem de qualquer estereótipo, de um pequeno hobbit tocado pelo mal a um gorila gigante solvo em Nova York. Ou um beberrão de história em quadrinhos. Ou o líder misterioso de um império galáctico. Ou um chimpanzé de inteligência evoluída por causa de uma experiência genética que termina como líder e salvador de uma raça inteira.

Andy Serkis, ao centro como Caesar, líder dos símios em Planeta dos Macacos: A Guerra

Caesar, líder dos símios na nova trilogia Planeta dos Macacos, é o maior exemplo do talento de Serkis em criar um personagem completo, com conflitos, dúvidas e dilemas, mas também dotado de extrema nobreza e absoluto senso de lealdade e justiça. Sua evolução de Planeta dos Macacos: A Origem, de 2011, a este novo Guerra é notável, um arco completo de um personagem complexo e, antes de toda a tecnologia, inviável. Mas todas as ferramentas seriam inúteis sem o artista certo, e Serkis é um ator de talento, talhado nos palcos ingleses, que viu no novo desafio apenas mais um passo na evolução natural de seu ofício. Ao lado dos diretores que o acompanharam nesta jornada, como Peter Jackson e Steven Spielberg, ele foi um visionário, a pessoa certa no momento certo com a disposição e o talento necessários.

Serkis já era veterano dos palcos e na TV britânica quando Peter Jackson o escalou para viver Gollum em O Senhor dos Anéis. Sua presença é sugerida em A Sociedade do Anel, primeiro filme da trilogia, mas quando As Duas Torres chegou ao cinema, o mundo foi tomado de assalto pela perfeição que era o hobbit desfigurado por séculos de contato com o Um Anel que englobava o Mal da Terra-Média. Com O Retorno do Rei, o público já clamava pelo reconhecimento de Serkis como um performer completo, mesmo que a Academia ainda não considerasse uma criação digital como atuação. O reconhecimento abriu espaço para ele mostrar seu próprio rosto em outros filmes, como A Festa Nunca Termina (de Michael Winterbottom), a comédia De Repente 30 (com Jennifer Garner) e O Grande Truque, em que dividiu a cena com Hugh Jackman e David Bowie sob o comando de Christopher Nolan.

Lord Of The Rings Two Towers: the character Gollum who's role is crucial to the journey of Frodo and Sam--Gollum's movements are performed via computer program by actor Andy Serkis. Photo: New Line Cinema

Gollum, de O Senhor dos Anéis, popularizou a captura de performance

Mas a captura de performance continuou sendo o talismã de Serkis, e o meio em que ele lapidou sua arte à perfeição. Peter Jackson lhe propôs o desafio de ser King Kong no remake do clássico, e a tecnologia em 2005 já aperfeiçoara a precisão para "ler" as expressões em seu rosto, traduzidas na face do gorila. As Aventuras de Tintin, de Steven Spielberg, criou não só o trabalho dos personagens da HQ clássica de Hergé, mas também todo mundo virtual em que eles interagiam. Recentemente Serkis entrou em dois universos cinematográficos sem paralelo de maneira bastante distinta. O Despertar da Força marcou seu ingresso no mundo de Star Wars, como o misterioso Supremo Líder Snoke que, à frente da Primeira Ordem, quer reerguer um império galáctico. O personagem é inteiramente criado com captura de performance, e seu passado permanece um mistério. Já para a Marvel ele surgiu com sua própria face como o traficante e mercenário Ulysses Klaue em Vingadores: Era de Ultron, e volta ano que vem em Pantera Negra.

A trilogia Planeta dos Macacos é o ponto alto da tecnologia de captura de performance, com atores usando os trajes de mo-cap ao lado do restante do elenco, interagindo em locações reais. Caesar e os outros símios são personagens de visual complexo, respondendo à perfeição a performance dos atores. "Mas é só uma ferramenta", enfatiza Serkis. "Antes de qualquer conversa sobre tecnologia, Matt (Reeves, diretor de Planeta dos Macacos: O Conflito e este A Guerra) ensaiou o roteiro para que os personagens e a narrativa estivessem perfeitos, e só depois pensamos em cenários e efeitos." O resultado é um filme de emoções genuinas que aborda a empatia como tema: "É muito atual e transformador, principalmente no contexto do mundo atual, em que as pessoas parecem ter perdido esse referencial".

O aparato para transformar Andy Serkis do Líder Snoke de Star Wars: O Despertar da Força

Quando peço para Andy apontar outros atores com trabalho de captura de performance que o deixaram de queixo caído, ele esboça um sorriso ao louvar seus pares. "Jim Carrey em Os Fantasmas de Scrooge é absolutamente brilhante, assim como Benedict Cumberbatch como Smaug em O Hobbit", aponta. "Mas eu te garanto que você vai ficar absolutamente abismado quando ver o que Christian Bale fez como Bagheera em minha versão de The Jungle Book." Serkis refere-se, claro, à adaptação do clássico de Rudyard Kipling, em que ele também é o diretor. "Depois que Peter (Jackson) me pediu para dirigir a segunda unidade em O Hobbit, fiquei mais confiante para assumir um projeto assim", conclui, orgulhoso. "Mas não é como a versão da Disney, minha visão é mais sombria, mais próxima ao texto de Kipling." É mais um passo na carreira brilhante de um artista verdadeiramente visionário. E que merece um Oscar, pode apostar que já passou da hora!

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.