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De Goonies ao novo Sicario, como Josh Brolin finalmente se tornou um astro

Roberto Sadovski

03/07/2018 16h23

Josh Brolin já teve seu nome enfeitando o cartaz de um filme. Foi em 2008 e a produção em questão era W., biografia em ritmo de paródia do presidente George W. Bush, que Oliver Stone dirigiu com mão pesada. O estrelato parecia flertar sempre com o ator, mas filmes como Jonah Hex, Caça aos Gângsters e Oldboy não alavancaram aquela percepção pública que faz de alguém um astro. 2018, entretanto, apresentou às plateias um novo Josh Brolin, mais confiante, com uma vida privada estável e contente em seu papel de coadjuvante. Essa tranquilidade parece ter pavimentado o caminho para que ele carimbasse seu nome em dois dos maiores filmes do ano: Vingadores: Guerra Infinita, no qual ele empresta personalidade ao maior dos vilões, Thanos; e Deadpool 2, em que ele usa seu semblante severo para dar ao viajante do tempo Cable o contraponto cômico perfeito ao personagem-título histérico. Sicario: Dia do Soldado, continuação inesperada da pequena obra-prima que ele fez em 2015, coroa um ano de êxito.

Não que Brolin, que completou 50 anos em fevereiro, desse muita bola pra isso. Nascido em Santa Monica, na Califórnia, o ator cresceu num rancho com a mãe, uma ambientalista, longe dos holofotes que seguiam seu pai, o ator James Brolin. Seu interesse como adolescente era o surfe, punk rock e drogas, em especial heroína. Mas atuar estava mesmo no sangue, e depois de tomar gosto pela coisa em aulas de improvisação na escola, ele abraçou algumas pontas na TV antes de morder o papel de Brand Walsh, um dos protagonistas de Os Goonies, que Richard Donner lançou em 1985. De repente, Brolin passou de anônimo a promessa juvenil, que quase caminhou quando ele foi um dos finalistas para encabeçar a série Anjos da Lei – o papel ficou com Johnny Depp, seu amigo até hoje. Depois da aventura tosca Os Skatistas (um verdadeiro manual para a Califórnia "radical" dos anos 80, com participação de vários atletas famosos e até dos Red Hot Chili Peppers), o ator ficou frustrado com o cinema e se voltou para o teatro e para a TV, voltando lentamente para os filmes já na virada do milênio.

Josh Brolin treina pesado em Os Goonies

Do lado de cá das câmeras, Brolin não se encaixava no estilo de vida dos astros em ascensão. Ele casou cedo, aos 20 anos, com a atriz Alice Adair, e teve dois filhos em seis anos de relacionamento. O noivado com Minnie Driver não foi além de seus meses, mas ele encontrou estabilidade com Diane Lane, com quem dividiu sua vida entre 2004 e 2013. Não foi um período fácil, pontuado por acusações de violência doméstica, mesmo que nenhum dos dois tenha levado algum processo adiante. O ator também se envolveu em brigas em bares e chegou a ser preso, bêbado, na virada do ano de 2013. Foi um ano difícil, em que o próprio Brolin admitiu estar num caminho destrutivo e precisar amadurecer para encontrar alguma estabilidade em sua vida. Separado, ele se envolveu com sua assistente, a ex-modelo Kathryn Boyd, com quem se casou em 2016.

Essa instabilidade se refletiu em seu trabalho. Josh Brolin, um intérprete de mão cheia, que combina charme juvenil com uma certa aura perigosa, sempre impressionou como coadjuvante, sendo responsável por grandes momentos em diversos filmes. Ele foi um agente do FBI bissexual ao lado de Ben Stiller e Patricia Arquette na comédia Procurando Encrenca (1996), enfrentou insetos gigantes com Mira Sorvino em Mutação (1997), e trabalhou com grandes diretores como Paul Verhoeven (O Homem Sem Sombra, 2000), Woody Allen (Melinda e Melinda, 2004), Robert Rodriguez (Grindhouse: Planeta Terror, 2007) e Ridley Scott (O Gângster, também em 2007). Foi justamente o ano de sua grande virada, quando ele foi escolhido pelos irmãos Joel e Ethan Coen como protagonista do western moderno Onde os Fracos Não Tem Vez, uma obra-prima que o recolocou nos holofotes como alguém capaz de conduzir uma narrativa como foco da história. A cereja no topo do bolo foi sua indicação ao Oscar por seu trabalho em Milk – A Voz da Igualdade, como o político reprimido que mata o ativista homossexual Harvey Milk (papel que deu a estatueta dourada a Sean Penn).

Thanos, o über vilão de Guerra Infinita

Os anos seguintes viram Brolin seguindo o caminho que Hollywood traça para qualquer história de sucesso, com o ator encarando projetos com maior ou menor peso, geralmente como amuleto da sorte de diretores com quem ele já trabalhou, como Oliver Stone (a continuação de Wall Street) e os irmãos Coen (o sublime Bravura Indômita, o divertido Ave, César!), ou como parte de uma trupe maior (Vício Inerente, Evereste). Curiosamente, muitos de seus filmes são histórias que tiveram sua origem nos quadrinhos. Jonah Hex foi uma tentativa canhestra da DC em começar uma série com o anti-herói do western. Oldboy foi a refilmagem da adaptação de um mangá. O divertido Homens de Preto 3 começou como uma série da extinta editora Malibu. Sin City: A Dama Fatal foi uma tentativa preguiçosa de recapturar a novidade que foi a primeira tradução para o cinema da série de Frank Miller, que ele mesmo dirigiu com Robert Rodriguez em 2005.

Thanos surgiu em sua vida num já distante 2014, quando ele gravou uma ponta, ainda não creditada, como o titã louco em Guardiões da Galáxia. Ele surgiu mais uma vez de relance no ano seguinte numa cena pós-créditos de Vingadores: Era de Ultron. Kevin Feige, presidente da Marvel e produtor de todos os filmes do estúdio, queria um ator que conferisse humanidade a um personagem que basicamente é um genocida cósmico. Ele sabia que, mesmo sendo um papel criado por tecnologia de captura de movimento e muita pós-produção digital, a plateia precisava enxergar em Thanos suas nuances, sua loucura e sua determinação quando ele finalmente surgisse como protagonista. Josh Brolin não decepcionou, e seu trabalho em Vingadores: Guerra Infinita é um ponto alto em uma aventura cheia de superlativos. Foi curioso ver Brolin de volta aos cinemas, poucas semanas depois, como Cable em Deadpool 2, emprestando a mesma postura trágica e dramática em um filme de tom radicalmente diferente.

O viajante do tempo Cable em Deadpool 2

Nesse sentido, Sicario: Dia do Soldado é como um respiro, um trabalho longe das engrenagens complexas das produções gigantes e recheadas com efeitos visuais, que dá ao ator a chance de retomar um de seus triunfos recentes. Sicario, que Dennis Villeneuve dirigiu em 2015, é um filme denso, acompanhando os bastidores de agentes da lei na explosiva fronteira dos Estados Unidos com o México. O novo filme perde a protagonista, Emily Blunt (a conclusão de Sicario não deixaria mesmo espaço para seu retorno), e também Villeneuve ( a direção agora é do italiano Stefano Solima). Mas ganha pela brutalidade de suas imagens e pelo trabalho não só de Brolin, como também de Benicio Del Toro. Pode ser uma continuação que surgiu meio que do nada, não vai fazer o barulho do original, mas é um filme redondinho, bem escrito e muito digno. No topo do poster está, com todo o destaque que merece, o nome do enteado de Barbra Streisand. Josh Brolin pode não dar muita bola para essa história de fama e fortuna. Mas com certeza a representa bem.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.