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Will Smith desafia as expectativas: Depois da Terra, afinal, é um bom filme!

Roberto Sadovski

05/06/2013 19h24

Depois da Terra é um filme jóia! Essa é a maior surpresa para quem profetizava que o novo filme com o astro Will Smith seria uma bomba. Tem lá seus tropeços. Em um ponto no final do primeiro ato a coisa engasga. A grande virada do protagonista no clímax parece apressada, sem uma construção mais elaborada ao longo da trama. E não há sutileza em abordar os temas propostos pela história. Mas só. De resto, este filme dirigido por M. Night Shyamalan e protagonizado por Smith pai e Smith filho é uma ficção científica sólida, bem engendrada e que tem uma visão, um tema que permeia a narrativa com resultados bem bacanas, ainda que apoiados em meia dúzia de clichês (e o que seria o cinema sem eles…).

Ainda assim, Depois da Terra foi apedrejado bem antes de sua estreia, experimentou hostilidade por parte de crítica e público em toda sua campanha e finalmente, com uma bilheteria pobre quando lançado nos Estados Unidos semana passada (27 milhões de dólares, uma mixaria para um pretenso blockbuster do verão, menos grana que o igualmente linchado John Carter), deixou seus detratores em júbilo.

Will Smith e a única expressão que ele vai usar em Depois da Terra

Isso me soa, na real, a picuinha. Depois da Terra é obviamente um "projeto de vaidade". Um filme que sai do chão por força única de seu protagonista/produtor quando ele cria um projeto por motivos mais pessoais que artísticos. No caso desta ficção científica, é a vontade de Will Smith em fazer de seu filho, Jaden, um astro com direito a ter o nome estampadão no topo do cartaz. Nepotismo puro e simples. Mas, oras, ele não pode? Will faz dezenas de filmes que rendem centenas de milhões de dólares e é um dos poucos astros de cinema globais a justificar o investimento. Agora sentiu vontade de discutir a relação de pai para filho com Jaden (que ancorou com bastante êxito a boa refilmagem de Karate Kid) da maneira que só gente com muita grana pode: em uma superprodução de cinema.

Isso, claro, incomoda muita gente. A patrulha do "Will não pode" foi grande, e logo Depois da Terra foi para a berlinda. O escolhido por Will para dirigir a história que ele bolou não ajudou: M. Night Shyamalan. Daí foi juntar má vontade com fúria total. Shyamalan foi apontado como "o novo Spielberg" no começo do século 21 depois de fazer o suspense de maior bilheteria da história com O Sexto Sentido. Depois realizou Corpo Fechado (talvez seu melhor filme) e arrebentou nas bilheterias mais uma vez com Sinais, desta vez com Mel Gibson. Mas daí foi ladeira abaixo (comercialmente falando) com A Vila e A Dama na Água. Fim dos Tempos, suspense sem pé nem cabeça sobre uma revolta das plantas (!) que pretendem arrasar com a humanidade (!!), é piada pronta. O Último Mestre do Ar, apesar de ter feito grana, foi uma aberração conceitual e artística.

Filho e pai em momento quase meigo antes do couro comer em Depois da Terra

Mesmo com a onipresente família Smith na frente e atrás das câmeras, Depois da Terra é um filme de Shyamalan no melhor sentido. O motivo é ele continuar a explorar o tema mais recorrente de sua filmografia: o medo. Desde que o mundo o conheceu com O Sexto Sentido, o diretor tem explorado a percepção do medo em diferentes formas. Medo de descobrir quem somos (Corpo Fechado), medo do desconhecido (Sinais), medo do descontrole social (A Vila), medo do capeta (Demônio, que ele só escreveu e produziu). Depois da Terra é um passo além, um estudo da superação do medo travestido em aventura intergaláctica.

Depois da Terra é, também, ficção científica no sentido mais puro da palavra. A trama, explica o prólogo, segue a mudança da humanidade para outro mundo, Nova Prime, depois de o homem tratar de deixar a Terra inabitável (Wall-E e Oblivion, só para citar rapidinho, já passearam por aí). Em seu novo lar, a humanidade enfrentou uma raça de alienígenas predadores que soltaram sua maior criação para dar cabo de nossa raça: os ursa, animais ferozes capazes de farejar suas vítimas pelo feromônio liberado pela adrenalina. Em outras palavras, eles podem cheirar nosso medo. Sutileza não é o forte de Shyamalan…

Jaden Smith vê os números da estreia de Depois da Terra e chora…

O filme engata uma segunda quando Will pai (general e heróis de guerra, capaz de enfrentar os ursa por ter aprendido a sublimar seu medo) e Jaden filho (rejeitado no teste físico para ser um ranger como o pai, ele traz a culpa de ter deixado a irmã mais velha ser morta por uma das criaturas caçadoras) são os únicos sobreviventes de um nave que desabou na Terra. Um milênio no futuro, o ar em nosso planeta é pesado demais para os humanos respirarem e a fauna evoluiu na forma de predadores irrefreáveis. Com Will preso à uma parte dos destroços com a perna quebrada, cabe a Jaden enfrentar 100 quilômetros de terra devastada para chegar à outra parte da nave e mandar um sinal de socorro para que eles possam ser resgatados. No caminho, pai e filho precisam aprender a se comunicar – Will trata Jaden como um cadete, e não como filho – e o medo do segundo precisa ser domado. Afinal, um ursa foi solto na queda e está à espreita. "O perigo é real, mas medo é uma escolha" é o mantra do paizão linha dura.

Linha dura mas orgulhoso da cria. Quando esteve no Brasil ano passado para divulgar Homens de Preto 3, Will Smith bateu uma hora de papo comigo – e boa parte foi para falar de Depois da Terra. Empolgadíssimo, ele falava como foi maravilhoso filmar ao lado do filho na selva, como Shyamalan havia trazido humanidade ao filme e como Jaden havia se graduado para protagonista de primeira linha no gênero que lançou o próprio Will – Independence Day foi quem o apresentou ao mundo no já distante 1996. Depois de tanta má vontade, de trailers modorrentos e de uma bilheteria de estréia pífia, a expectativa para ver o filme estava no chão. Mas, em algum ponto no meio da sessão, lembrei-me do papo com Will, e Depois da Terra ganhou mais subtexto. Não há nada errado em um pai querer o melhor para o filho. E não há nada errado tornar esse desejo público em uma produção de 130 milhões de dólares. E nada disse deve ter relevância no momento em que as luzes se apagam e a sessão começa. E quando ela termina, Depois da Terra se mostra um filme bem decente. Mas é isso. Agora Smith pai precisa deixar Smith filho caminhar com as próprias pernas. Soltar a prole no mundo não é só uma escolha: é uma necessidade.

Confira a seguir trailer, galeria de fotos e entrevista com Will Smith, Jaden Smith e M. Night Shyamalan

TRAILER DO FILME "DEPOIS DA TERRA"

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.