Novo Blade Runner ganha diretor, terá Harrison Ford... e é um sacrilégio!
O mundo vez por outra nos faz morder a língua. Caso em questão, a continuação de Blade Runner. Vejamos. Desde sempre eu fui defensor sem limites de remakes, reboots, adaptações de outras mídias para o cinema, continuações, reimaginações e por aí vai. Acho que uma obra pode – e deve! – ser reinterpretada sempre que possível. Acho bacana um artista dar sua visão sobre algo que, muitas vezes, consideramos intocável, tão firme sua posição na cultura pop. A obra de Shakespeare, por exemplo, já teve centenas de versões diferentes, colocadas em outros contextos, outras visões, outra cronologia. O Senhor dos Anéis foi virado ao avesso e adaptado para cinema com várias mudanças. Achou ruim? Ora, os textos originais não foram mexidos. Mad Max: Estrada da Fúria está a caminho – mas a trilogia de George Miller, com Mel Gibson, continua no mesmo lugar. Nenhum maluco com um machete invadiu sua sala, destruiu sua cópia de Watchmen (o gibi) e deixou no lugar Watchmen (o filme).
Mas, cara…. deixem Blade Runner em paz!!!
O obra prima de Ridley Scott (com Alien – O Oitavo Passageiro em seus calcanhares) é um filme perfeito. E não importa a versão. TODAS traduzem à perfeição o mundo cyberpunk tecido por Philip K. Dick, em que replicantes, os robôs quase humanos, revoltam-se contra seus criadores e pedem a única moeda que, depois de perdida, é irrecuperável: tempo. Em meio a essa busca, um "caçador de andróides", Rick Deckard, envolve-se neste universo neo-noir para eliminar os "produtos defeituosos". No processo, depara-se com sua própria mortalidade. Blade Runner é um assombro de design, narrativa, conceito, direção – um dos filmes mais influentes do cinema moderno. Harrison Ford faz aqui um de seus melhores trabalhos. A cada sessão, é possível perceber uma nova surpresa em cada canto escuro. Ridley Scott praticamente escreveu um capítulo no livro de "como construir mundos", fazendo com que o filme não pareça fumaça e espelhos em um cenário erguido em um galpão: o que vemos é real, a ilusão perfeita do real, o tipo de carpintaria cinematográfica minuciosa que, sorry, nem o CGI mais perfeito seria capaz de mimetizar. Eu já disse que é o filme perfeito?
Mas Blade Runner, apesar do fracasso inicial de seu lançamento nos cinemas, e sua posterior redescoberta que o elevou a status cult, é também um produto. Como todo produto, é passível de reinvenção. Portanto, nada mais natural que algum produtor voltasse seu olhar para a possibilidade de continuar a história de Deckard. O sacrilégio? Não precisa! Blade Runner é perfeito por ser um recorte, por sugerir um mundo muito além do que acontece em cena e deixar que nossa imaginação preencha as lacunas. Saber o que acontece ao Caçador de Andróides é irrelevante, porque uma explicação em nada elevaria a narrativa original – só ver o que o próprio Ridley Scott fez em Prometheus ao tentar "expandir a mitologia" de seu próprio Alien. E aí eu caio em minha própria armadilha, já que a defesa que eu faço tão apaixonadamente ganha outros traços quando volto o espelho para minha própria lista de favoritos. é um saco, mas também inevitável. Língua mordida. Segue o jogo.
A notícia em meio a esse trelelê todo é que Blade Runner vai, sim, ganhar uma continuação. A intenção existe há alguns anos, mas agora os primeiros fatos ganham forma graças à produtora Alcon Entertainment. O principal é que o novo filme pode ter seu diretor na forma do canadense Denis Villeneuve (Incêndios, Os Suspeitos, O Homem Duplicad0), em "negociações" para assumir o comando… e como a notícia vem em um press release da própria Alcon, eu chuto que as negociações estão 99 por cento fechadas. Harrison Ford será mais uma vez Rick Deckard, o que solidifica a informação que a nova trama, escrita pelo roteirista do filme original, Hampton Fancher, se passa algumas décadas depois de Rick e sua amada, Rachel, saírem de cena – pobre Sean Young, sequer é citada para o novo filme. Ridley Scott assume o papel de produtor executivo. As filmagens começam no meio de 2016, para um provável lançamento no ano seguinte. Era inevitável.
O filme original, claro, continuará brilhante e imutável. As lembranças continuarão a se perder como lágrimas na chuva. Em todo caso, vou trancar minha cópia em um cofre…
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