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Por que Batman vs. Superman pode salvar os super-heróis da DC no cinema

Roberto Sadovski

17/07/2015 11h45

Screen shot 2015-07-17 at 3.07.27 AM

O "universo cinematográfico DC" teve início em 2013, com o lançamento de O Homem de Aço. Cinco anos de atraso em cima de seu concorrente óbvio, a Marvel, que já lhe deixa atrás de um rastro de poeira. O que é impressionante, tendo em vista que a "Casa de Ideias", do Homem-Aranha e X-Men, há pouco mais de uma década era uma verdadeira bagunça, com seus heróis espalhados por vários estúdios. A DC, por outro lado, pertence à Warner, e seus personagens estão, em teoria, sob um mesmo teto. Ainda assim, a falta de estratégia e total ausência de sinergia interna fizeram com que suas tentativas de conversão do papel para o celulóide tenham resultado ou em filmes ruins (Superman – O Retorno, Lanterna Verde), ou em uma série hermética, sem a menor pretensão de gerar um "universo" (a trilogia O Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan).

O segundo trailer de Batman Vs. Superman: A Origem da Justiça, jogado ao mundo durante a Comic-Con de San Diego, ao menos sugere um caminho. Melhor ainda: esboça uma visão, um plano de jogo, a ideia que, desta vez, existe uma preocupação temática e estética para amarrar seus filmes daqui por diante. O preview de Esquadrão Suicida, que chega aos cinemas em agosto de 2016 (e que eu dei uma espiada aqui), revelando a nova face do Coringa (Jared Leto) em um filme sobre vilões que salvam o dia, corrobora a mesmíssima teoria. As reações, de fãs e observadores, dividiram a internet. O chapa Alexandre Matias, colega do UOL, viu no trailer um futuro funesto não só para a DC, mas para super-heróis no cinema em geral. Concordo com ele em ao menos um ponto: é muita informação para entregar em um filme de duas horas e meia. Mas ainda é muito, muito cedo para bater o martelo. Eu continuo otimista e permaneço do lado de quem aposta em um grande filme – e, acredite, será gigante! A discussão é boa, e ainda temos muito chão para queimar até descobrir qual é, afinal, a de Batman Vs. Superman.

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Então é bom tirar logo uma coisa da frente: eu acho O Homem de Aço um ótimo filme. Sério. Escrevi minhas impressões à época, e continuo firme na opinião que a construção do universo por Zack Snyder, apesar dos soluços, foi eficiente. A revelação do herói ao mundo é mesmo o marco zero dessa nova leva de filmes que agora vão compartilhar um mesmo universo. Na verdade, como a inspiração vem dos quadrinhos, entrelaçar os filmes é uma decisão tão óbvia que é espantoso que a Marvel precisou fazer isso em grande escala para que os homens do dinheiro percebessem o potencial para big business. Além disso, distanciar o Superman de sua encarnação mais famosa no cinema – a imortalizada por Christopher Reeve – foi um grande acerto, que de cara evita comparações. O tom mais sóbrio, por sinal, também diferencia as produções DC do Universo Cinematográfico Marvel, que com uma dúzia de filmes se mostra mais solar e mais leve, apesar de lidar com riscos igualmente pesados: entrar no jogo, já em desvantagens e com as mesmas armas não parece um plano inteligente, e distanciar o novo filme do estilo Marvel deve abrir um caminho novo.

Pedigreé, claro, Batman Vs. Superman tem de sobra. A inspiração para a trama, afinal, é a série clássica de quadrinhos Batman: O Cavaleiro das Trevas, com a qual Frank Miller reinventou o modo de contar histórias de super-heróis lá atrás, em 1986. Apesar de Zack Snyder deixar claro que não é uma adaptação literal da trama – que mostra Batman, velho e aposentado, voltando à ativa num mundo ainda mais violento e, no fim, tem de lidar com Superman, agora um capacho do governo –, e sim uma homenagem, com algumas imagens retiradas quase que exatamente do papel. O uniforme do Batman, por sinal, é praticamente um espelho do traço de Miller, com um Homem-Morcego velho, carregando o peso do mundo em seus ombros, combalido após perder décadas de batalhas contra o crime, mas impelido a retornar ao mundo após observar o estado caótico das coisas – e o surgimento de um novo poder capaz de desequilibrar a balança do mundo.

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O caos em Batman Vs. Superman é uma continuação direta da destruição no clímax de O Homem de Aço. Muitos fãs na época reclamaram que a batalha épica entre o Superman e o General Zod, que reduziu Metrópolis a cinzas e deve ter ceifado centenas de vidas, não condizia com a natureza do herói, que jamais deixaria uma vida humana ser perdida. Eu acho o total oposto: Kal-El não teve escolha, já que enfrentava um inimigo que deixou bem claro que só seria detido com a morte, e sua decisão seria algo que não só o assombraria, como também determinaria seu compasso moral futuro. Uma grande sacada no novo filme é colocar Bruce Wayne, o Batman, como testemunha ocular muito próxima da devastação, ampliando a tragédia ao fazer com que a Torre Wayne – e supostamente seus funcionários, dentre eles provavelmente muitas pessoas próximas a Bruce – fosse reduzida a cinzas. É mais uma motivação para que o Batman direcione sua fúria ao alienígena superpoderoso.

Ter o Cavaleiro das Trevas no filme, por sinal, é a cereja no topo do bolo. O óbvio: o Batman é o super-herói dos quadrinhos mais famoso do mundo. Apesar da força de rolo compressor da Marvel, só mesmo a criação de Bob Kane consegue comandar a atenção do público fora do nicho sem precisar de bula. Ao contrário do Homem de Ferro, por exemplo, que ainda tem seu sucesso intimamente associado a Robert Downey Jr., o Batman não depende de quem veste o traje. Tim Burton, com Michael Keaton atrás do capuz, conseguiu um fenômeno de bilheteria e artístico brilhante em 1989. Christian Bale conduziu o personagem a patamares ainda maiores em três filmes de Christopher Nolan. É possível até argumentar que Val Kilmer e George Clooney não fizeram feio, embora estivessem em filmes pavorosos. Engraçado a essa altura ver como Ben Affleck, motivo de tanta polêmica quando foi escolhido para vestir a capa, abraça de maneira vitoriosa o aspecto mais trágico do personagem no novo filme: ele não é um herói no auge, e sim alguém que perdeu tudo, que jogou a toalha, que é obrigado a voltar ao jogo quando forças maiores que ele entram em ação.

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E este pode ser, afinal, o maior triunfo de Batman Vs. Superman: A Origem da Justiça: juntar na tela estas forças, ícones dos quadrinhos que estão no mundo há mais de 75 anos. Quando mostrei o trailer a amigos que não acompanham gibis, todos ficaram empolgados com a possibilidade de ver o Homem de Aço e o Cavaleiro das Trevas juntos no mesmo filme – mais surpresos ainda quando apontei a Mulher Maravilha, em toda sua glória! E foram além: todos ficaram entusiasmados em ver que o filme de Zack Snyder entrega uma alternativa à fórmula Marvel que, apesar de vencedora, corre o risco de ficar estagnada na percepção do grande público. Super-heróis lutando não são novidade no papel, mas no cinema Batman Vs. Superman oferece algo único: a possibilidade de dois ícones incontestáveis dividir a cena do modo mais tradicional possível, que é saindo no braço para depois encarar um inimigo em comum. A DC não é a Marvel – e essa tradição parece que será levada também para o cinema. Resta saber se, na prática, esse embate de empresas, filosofias, estética e universos será positivo para ambos os lados. Eu aposto que sim.

Comic-Con 2015: Veja 2º trailer legendado de "Batman vs Superman"

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.