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Como um desastre chamado Batman & Robin quase enterrou, vinte anos atrás, os filmes de super-heróis

Roberto Sadovski

29/06/2017 23h52

Saindo do lançamento de Sr. & Sra. Smith, mais de dez anos atrás em Los Angeles, esbarro com o produtor e roteirista Akiva Goldsman no lobby do hotel. Uma breve apresentação depois, disparo: "Sr. Goldman, eu sei que você deve estar de saco cheio de ouvir a mesma pergunta…. Mas o que aconteceu de errado com Batman & Robin?". Ele suspirou, deu um sorriso e respondeu, com bom humor: "Tudo". O filme de Joel Schumacher, lançado na temporada do verão americano de 1997, é um completo desastre. De ponta a ponta, representa o pior do pensamento corporativista, o auge da falta de compromisso com um personagem e colocou uma pá de cal na ideia de trazer super-heróis dos quadrinhos aos cinemas. Foi só três anos depois, com X-Men, que a maré começou a ser revertida. Akiva Goldsman foi roteirista e resume bem o fracasso: "Quando gente de marketing do McDonald's começou a dar opiniões no roteiro, percebi que era um jogo que não dava pra ganhar".

Ninguém, de fato, ganhou. Batman & Robin entrou para a história como a pior adaptação de um personagem de quadrinhos da história. George Clooney, que defendeu o papel do Homem-Morcego, quase viu sua nascente carreira nos cinemas desaparecer. Chris O'Donnell e Alicia Silverstone (Robin e Batgirl) basicamente seguiram o caminho do dodo. Uma Thurman e Arnold Schwarzenegger, os vilões Hera Venenosa e Mr. Freeze, tiveram melhor sorte, embolsaram um cheque gordo e seguiram a vida. Apesar da campanha de marketing gigante na época, o filme mal chegou nos 100 milhões de dólares nas bilheterias ianques. Os estúdios fecharam as portas para filmes com heróis dos quadrinhos – ao menos com essa escala. Com o tempo, porém, ele adquiriu um certo status cult e os fãs, que reencontraram um Batman digno no cinema oito anos depois com Batman Begins, aprenderam a rir da coisa toda. A indústria, por sua vez, ganhou um manual sobre como não fazer um filme de super-heróis. Duas décadas depois e nada chegou perto de ser tão deplorável e ridículo.

Hasta la vista, baby….

O principal motivo foi miopia pelos responsáveis por Batman como propriedade intelectual dentro do estúdio à época. Em teoria, Batman & Robin continua a saga iniciada de forma brilhante por Tim Burton em dois filmes (Batman e Batman – O Retorno) e assumida por Joel Schumacher de modo mais "seguro para a família" em Batman Eternamente. Entretanto, a não ser que o tom seja da paródia declarada (a série de TV dos anos 60, o recente Batman Lego), o Cavaleiro das Trevas é um personagem mais sombrio por excelência. Eternamente ainda trazia ecos do sujeito atormentado por uma tragédia. Batman & Robin é só um circo. A intenção nunca foi fazer um filme do Homem-Morcego, e sim bolar um comercial de brinquedos gigante. Óbvio que a função de filmes assim é também vender produtos, mas quando essa necessidade engole qualquer função narrativa, o resultado só pode ser desastroso.

No centro do furacão, George Clooney sequer se esforçou para conferir alguma dimensão ao protagonista. Escolher o ator certo já ajuda com boa parte do trabalho, mas Clooney trazia um queixo bacana e pouco além. Sem nenhuma direção, ele deixou as nuances do personagem de lado, fazendo com que Bruce Wayne e o Batman parecessem basicamente o mesmo sujeito em todas as cenas. Só para comparar, nas trilogia O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan, Christian Bale surge de uma maneira quando está com Michael Caine (o mordomo Alfred), muda o registro quando é Wayne em público e abraça uma terceira persona quando está em campo como o Batman. Se Schwarzenegger estava contente em ter uma artilharia de bordões, o resto do elenco é um borrão. Tanto melhor: era mesmo impossível dizer aquelas linhas de diálogo sem parecer estar sob efeito de alguma droga psicotrópica.

Grandes momentos da história do cinema moderno

Quando X-Men chegou aos cinemas, o plano era distanciar-se o máximo possível da "fórmula" de Batman & Robin. Cenários espalhafatosos e roupas saídas de desfile de carnaval deram espaço a um tom mais sóbrio, em que a jornada dos personagens, e não a perfumaria, era o mais importante. A cada novo filme de super-heróis (Homem-Aranha, Batman Begins, Homem de Ferro, Kick-Ass), o cinema deixava claro que tinha aprendido a lição a duríssimas penas. Adaptações de personagens de quadrinhos exigem a mesma atenção e a mesma paixão que qualquer outro projeto cinematográfico. A herança de Batman & Robin foi apontar, ao custo de mais de 200 milhões de dólares, um caminho a jamais ser seguido. Não é um filme engraçado, não é curioso, não é cult: é só um produto estragado, fruto de um pensamento torto. A indústria, aparentemente, aprendeu a lição. Mesmo que teime em, vez por outra, despejar nos cinemas um Esquadrão Suicida.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.