Topo

Política, vingança e guerra: Por que os dragões de Game of Thrones mereciam estar no cinema

Roberto Sadovski

10/08/2017 16h48

Um exército se prepara para deixar o campo. A tensão é palpável. Soldados espalhados, nem todos certos de sua aliança, em especial para um líder que não se porta como tal. Lentamente, um som de trovão corta a já frágil tranquilidade. Olhos no horizonte, e aos poucos o pó levantado pela marcha do inimigo dá lugar a uma massa de guerreiros furiosos. A batalha é iminente, mas ainda equilibrada. Até que, no ar, um dragão imponente corta as nuvens, cavalgado por sua rainha, implacável em seu ataque. A tensão se torna medo quando o dragão dispara pilares de fogo, aniquilando as forças opostas, abrindo espaço para os guerreiros que entram em cena rasgarem o adversário como a foice sobre a colheita. Corpos carbonizados. Sangue jorrando a cada golpe de espadas. O fôlego? Já foi para o espaço!

Hora de abrir o jogo: eu só vi a primeira temporada de Game of Thrones. Sou péssimo em ter a disciplina de acompanhar uma série a cada semana. Sou ainda pior com o hábito de "baixar" pela internet episódios que não foram exibidos por aqui. As temporadas do programa que adapta os livros de George R.R. Martin fazem uma pilha de blu rays em minha estante – seis até agora – e eu sei que um dia vou encarar tudo de uma só vez, mergulhando em overdose num mundo de política, vingança e guerra. Não lembro de outra série que tenha mobilizado fãs com tamanha paixão, gerando discussões, vídeos, teorias, ensaios, especulação. É o grande retrato da era da internet, em que todo mundo, em todo o mundo, tem um fórum para compartilhar sua paixão em tempo real. É uma tribo imensa, e ai de quem não faz parte dela!

Puff the Magic Dragon….

Eu acompanhava tudo do lado de fora, mas fui convencido pelo pessoal do UOL para ver o quarto episódio da sétima temporada, o mais comentado, analisado e aplaudido em uma série de superlativos. Me tranquei numa sala da redação e retornei, por pouco menos de uma hora, ao mundo de Game of Thrones. Em uma palavra: impressionante. Sem o menor contexto, revi alguns personagens da primeira temporada, agora mais velhos, quebrados por uma vida de morte, com a inocência em seu olhar substituida ora por determinação, ora por distância, ora por desespero. A fluidez da narrativa envolve até quem não está familiar com nomes de terras, famílias, reis e rainhas, heróis e vilões. A sensação é que, com o fim da série já no horizonte, os riscos surgem maiores e o destino de todos começa a se desenhar. É empolgante, tenso e surpreendente.

Ah, e fechou com a batalha que eu sugeri lá no alto….

A essa altura, qualquer fã de aventuras épicas já está calejado com batalhas incríveis encenadas no cinema. De O Senhor dos Anéis a Warcraft, o cinema de fantasia abraçou a tecnologia para criar espetáculos tão perfeitos quanto impactantes. Mas Game of Thrones dá um passo além ao colocar uma produção dessa escala em uma série de TV. Traz a brutalidade de Coração Valente e a precisão de Gladiador. Não faltam referências para executar uma cena perfeita. O cuidado com os detalhes impressiona, assim como a geografia da coisa toda: do dragão no céu aos soldados em solo, não existe um elemento fora do lugar, não existe um movimento que não impulsione a narrativa. Não é uma carnificina ao acaso, existe uma lógica elegante e sangrenta na batalha conduzida pelo diretor Matt Shakman. Afinal, sabemos que os arquitetos do programa sabem (e podem) criar um momento épico como esse. O que o eleva acima da média é seu propósito.

Daenerys, cavalgando seu dragão, é a rainha do pedaço

No caso do clímax de "The Spoils of War", é provar a determinação de Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) como regente e como guerreira, capaz de tomar a frente da batalha para determinar o rumo da guerra. Pelo texto de David Benioff e D.B. Weiss, está chegando o momento em que todas as famílias, todos os reinos, terão de se unir contra um inimigo em comum, a ameaça definitiva que pode eliminar a todos. Cada cena antes da batalha é mais uma peça no tabuleiro, e a narrativa é construída sem pressa, para que sua conclusão tenha o máximo de impacto. Tudo isso a melhor produção que a TV já colocou no ar. Ao terminar de assistir ao episódio, lembrei de uma época sem internet. Sem televisão, até. Em que os seriados eram a alegria da petizada a cada semana, no cinema. Isso lá nos anos 30… Não seria sensacional assistir a cada pedaço de Game of Thrones no cinema, com telão gigante e som de trovão? Sonhar não custa.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.