Guerra Infinita: O que aconteceu, afinal, com o Incrível Hulk?
Pessoas, eu estou animado para falar sobre Vingadores: Guerra Infinita, então preparem-se para uma enxurrada de textos dissecando, teorizando, provocando e/ou iluminando algum recorte do filme dos irmãos Russo. Nem precisa dizer que o texto a seguir tem SPOILERS até dizer chega! Neste episódio, como meu título já entrega, vamos falar sobre o que aconteceu (e o que pode acontecer) com um certo Gigante Esmeralda. No cinema E nos gibis. Vamos a ele?
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Ainda aqui? Então beleza.
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"Temos um Hulk." Uma simples frase foi o bastante para o cinema vir abaixo, e olha que Guerra Infinita não tinha cinco minutos de projeção. Pegando a ação ao fim de Thor Ragnarok, encontramos a nave refúgio dos últimos asgardianos abordada pelas forças de Thanos. Thor, derrotado. Heimdall, gravemente ferido. Loki, caprichando na língua afiada do Deus da Mentira. Quando o Titã Louco faz sua investida final, determinado a recuperar a Jóia do Espaço – gema alojada no Tesseract -, o Hulk ataca! A luta é brutal… e breve. Fisicamente, Hulk e Thanos podem ser equivalentes, mas o herói verde sempre se virou massacrando com os punhos, e logo fica claro que ele não é páreo para alguém com treinamento de combate avançado. Derrotado, o Hulk é teletransportado para a Terra num último esforço de Heimdall, aterrissa dentro do santuário do Doutor Estranho em Nova York e, revertido à forma de Bruce Banner, consegue murmurar um aviso: "Thanos está vindo".
E é a última vez que vemos o Hulk em Guerra Infinita. Em diversas outras cenas, Bruce Banner (Mark Ruffalo) tenta forçar a transformação no Gigante Esmeralda, sem sucesso. Nem nos momentos mais críticos da aventura o Hulk dá as caras. Significa que Banner não está furioso o bastante? Não, pelo contrário: é seu alter-ego que simplesmente se recusa a se manifestar, deixando Banner na mão. O "outro cara", como o cientista muitas vezes se refere à manifestação furiosa de seu Id disparada pela exposição maciça à radiação gama anos antes, não aceita a mudança física, fazendo com que sua porção "humana" entre na Batalha em Wakanda usando uma poderosa armadura Hulkbuster – uma versão 2.0 do traje que Tony Stark usou em Vingadores: Era de Ultron para subjugar o gigante. Muitos fãs chiaram, dizendo que esse recorte da trama não fazia sentido, e que o Hulk "jamais" fugiria da luta. Outros estranharam o subtexto psicológico da relação Hulk/Banner, que em nenhum outro momento no MCU (o Universo Cinematográfico Marvel) se manifestara dessa forma.
Mas a verdade é que o arco dramático de Bruce Banner em Guerra Infinita não só é 100 por cento condizente com a evolução do personagem nos filmes anteriores, como também esbarra na bizarrice que são as diversas interpretações do personagem nas histórias em quadrinhos. Primeiro, o filme. Em Os Vingadores (2012), Banner mostra que controla sua transformação, dosando sua raiva e "convocando" seu alter-ego. Essa relação fica mais complexa em Era de Ultron. Sim, ele luta ao lado dos Vingadores. Mas somente a Viúva Negra parece capaz de direcioná-lo como uma arma contra os inimigos certos. Ao fim da aventura, porém, o Hulk desaparece, solitário, em um jato da equipe sem rumo. Seu destino foi conhecido somente em Thor Ragnarok: a nave foi para o espaço, capturada por um grupo de "lixeiros" espaciais, fazendo com que o Hulk se tornasse gladiador em um planeta ermo, dominado pelo Grão-Mestre (Jeff Goldblum). Ali, ele finalmente deixou de ser visto como um monstro, passando a ser ídolo de todo o planeta em combates realizados em uma arena cósmica. Em uma leve adaptação da série de quadrinhos Planeta Hulk, o Gigante Esmeralda encontrou a paz na glória do combate.
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A pegadinha é que o "protagonista" aqui é o Hulk, e não Banner. Desde Era de Ultron, o cientista permanece imerso na psique do Hulk, este em total domínio da situação. Com a chegada de Thor na arena, e depois de um combate em que o Deus do Trovão surge vitorioso (por muito pouco), Banner ressurge ao reencontrar a nave que o levara até este mundo alienígena. Ao lado de Thor, ele percebe que não deixou de ser o Hulk por dois anos. Como a criatura passou esse tempo acumulando experiências sem reverter a seu "eu" fracote, sua mente se desenvolveu como a de uma criança de…. 2 anos! Hulk ainda é absurdamente poderoso, mas faz birra e tenta construir frases como uma criança o faria. Nesse ponto chegamos em Guerra Infinita, e o Gigante Esmeralda leva uma sova de Thanos. De volta à forma de Banner, ele se recusa a assumir o comando novamente. O motivo é claro: medo! Depois de apanhar sem piedade, uma criança de 2 anos ficaria apavorada de seu algoz. E é exatamente isso que acontece. O desfecho dessa narrativa em particular deve ser mostrado no quarto Vingadores ano que vem. Mas é um detalhe esperto e coerente que as cabeças pensantes da Marvel introduziram em Guerra Infinita para adoçar ainda mais o suco.
Para quem acompanha os heróis da Marvel unicamente pelo MCU, essas mudanças do Hulk podem parecer até radicais. Nos quadrinhos, porém, poucos personagens experimentaram tantas mudanças quanto o herói brutal. Quando foi criado em 1962 por Stan Lee e Jack Kirby, o Hulk era menor, menos forte e cinza. Com o tempo seu visual e sua personalidade bestial foram estabelecidas, até as histórias dos anos 70/80 em que ele ganhou seu visual definitivo pelo artista Sal Buscema. Em seu traço, o Hulk ganhou as eternas calças roxas rasgadas, cabelos desgrenhados e massa muscular que o faziam parecer com uma parede. Essa versão, não raro roteirizada por Bill Mantlo (criador do Rocket Racoon), foi a que solidificou o personagem quando eu comecei a ler gibis lá pelo fim dos anos 70, e ela perdurou até a metade da década seguinte. O Hulk "burro" ainda duraria muito, mas a evolução dos quadrinhos fez com que a interpretação de diversos autores se tornasse mais sofisticada.
As estripulias dos roteiristas que seguiram trabalhando com o Gigante Esmeralda fizeram Banner controlar o corpo do Hulk, para logo depois transformar a criatura numa fera irracional, sendo banido para um cruzamento de dimensões paralelas (quadrinhos, eu sei, mas vai seguindo o fluxo….). Depois ele teve seu corpo e o de Banner separado e reunido, numa conjunção de histórias que resultou num par de fases bizarras e interessantíssimas – geralmente conduzidas pelo roteirista Peter David. Na primeira, o Hulk voltou a ser menor, menos poderoso e cinza, mas inteligente e levemente canalha. Ele assumiu a alcunha "Sr. Tira-Teima" e foi trabalhar como leão-de-chácara num cassino em Las Vegas (sério, quadrinhos, vem comigo!). Em seguida ele alternava a transformação em Banner quando o dia virava noite, com sua mente cada vez mais fragmentada por suas diferentes personalidades. Ao fim dos anos 80, então, David criou uma das versões mais bacanas do herói: em uma sessão de terapia bizarra, todas as facetas da mente e do corpo de Banner (o cientista, a criatura verde desenfreada, a versão cinza, inteligente e astuta) em um ser completo. Foi a fase mais "super-herói" do Hulk, em que ele chegou a liderar um grupo de superseres dedicados a proteger a humanidade, o Panteão.
Nas décadas seguintes, encostando nos dias de hoje, cada novo artista que assume o roteiros do Hulk nos quadrinhos imprime sua marca, usando a dualidade do herói ora como metáfora da violência inerente a todo ser humano, ora como uma lembrança de nossa fragilidade – recentemente Banner seguia isolado, sem se tornar o Hulk por um ano, mas os eventos da série Guerra Civil II podiam desencadear sua transformação mais violenta e imprevisível, o que foi interrompido com uma flecha no Gavião Arqueiro em sua cabeça. Como a morte nos quadrinhos nunca é definitiva (e, acredito, também não o será no MCU), Banner voltou recentemente como o Hulk em uma nova série assumidamente de terror, com o traço intenso do brasileiro Joe Bennett. O "Hulk medroso" de Vingadores: Guerra Infinita pode até ter parecido estranho para quem não acompanha a trajetória do personagem. Quem está calejado com as dúzias de encarnações do Gigante Esmeralda, porém, deve ter esboçado um sorriso cúmplice no cinema, sabendo que, quando o Hulk decidir voltar, será um evento (como é mesmo que dizem por aí?) épico! Um herói cuja jornada tem tantas variações que, no cinema, ela está longe de terminar.
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