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Fênix Negra: maior desafio do último X-Men é criar uma despedida relevante

Roberto Sadovski

27/09/2018 04h05

Essa é a última vez que veremos essa equipe de X-Men nos cinemas. Vou além: Fênix Negra, que acabou de ganhar seu primeiro trailer, é o canto do cisne da versão da Fox dos mutantes da Marvel, e o fim de uma era que deu o pontapé no filme de super-herói moderno, lá atrás, com a aventura de ficção científica que Bryan Singer dirigiu na virada do milênio. A tarefa que o diretor estreante Simon Kinberg colocou nos ombros é desafiadora: levar aos cinemas a saga mais conhecida dos heróis nos quadrinhos. O clássico assinado por Chris Claremont e John Byrne, que definiu a Marvel nos anos 80 (ao lado do Demolidor de Frank Miller), teve uma chance desperdiçada em 2006 com X-Men: O Confronto Final, em que Brett Ratner pegou o bonde andando e não captou a grandiosidade da história cósmica. Pelo que o trailer de Fênix Negra mostra, os fãs mais radicais ficarão mais uma vez a ver navios…

O motivo é claro: o cinema não comporta algumas histórias como elas existem em seu formato original. No papel, A Saga da Fênix Negra mostra uma equipe já adulta de X-Men, acompanhando a evolução do poder de Jean Grey, que passa da telepata e telecinética Garota Marvel à poderosa Fênix. As maquinações de um membro do famigerado Clube do Inferno desperta seu lado sombrio, e a Fênix Negra surge como uma genocida estelar, com seu poder devastador destruindo uma estrela e colocando seus colegas numa luta contra um império galáctico travada na Lua. É piegas, é emocionante, é carregada de ação. E seria virtualmente impossível de ser traduzida a contento para o cinema. Kinberg, envolvido com a série como roteirista e/ou produtor desde o próprio O Confronto Final (que ele garante ter chegado aos cinemas com seu texto radicalmente modificado), sabia o risco de arriscar uma nova adaptação. E agora é meio tarde para corrigir o curso.

Sophie Turner torna-se a Fênix Negra na última aventura destes X-Men

Até porque muita gente, inclusive dentro da indústria, duvidava que o filme veria a luz do dia, que ele seria enterrado (ao lado de Os Novos Mutantes) sob a luz da aquisição da Fox pela Disney – e consequente integração dos "produtos" Marvel no estúdio, os X-Men e o Quarteto Fantástico, ao Universo Cinematográfico guiado pelo produtor Kevin Feige. Fênix Negra teve sua estreia adiada, e o filme foi submetido a uma bateria de refilmagens. O que é comum em produções dessa escala, mas incomum quando seus atores deixam escapar que a trama teve de ser praticamente reescrita. O drama de bastidores não é incomum, mas pode resultar em um filme bacana (Homem de Ferro foi rodado praticamente sem roteiro pronto), pode resultar num desastre (Han Solo – Uma História Star Wars, primeiro tropeço da saga). O fato é que Fênix Negra aparentemente descarta todos os elementos que fizeram de sua inspiração nos gibis um clássico para se concentrar numa trama similar, veja só, a de O Confronto Final.

O plot desfraldado no trailer mostra Jean Grey (Sophie Turner) lidando com a escalada de seu poder. Assim como no filme de Brett Ratner, fica claro que o professor Charles Xavier (James McAvoy) colocou algumas travas na mente de sua estudante, segurando seu potencial enquanto pensava numa maneira de conter seu poder. Assim como em O Confronto Final, Jean deixa a Escola para Jovens Superdotados e busca em Magneto (Michael Fassbender) um mentor para direcionar suas habilidades ampliadas. Assim como no filme tão vilipendiado por fãs dos mutantes, os X-Men precisam escolher entre salvar sua colega ou sacrificá-la para que ela não destrua o planeta. A diferença fundamental é que Fênix Negra não traz Wolverine. Por outro lado, Ciclope (Tye Sheridan) parece finalmente ganhar papel de destaque. Resta saber onde se encaixa a enigmática personagem de Jessica Chastain e como os realizadores do filme pretendem justificar aos devotos mais fervorosos que, pela segunda vez, sua HQ do coração não vai ganhar versão em cinema a altura.

Simon Kinberg dirige Michael Fassbender, mais uma vez como Magneto

Mas isso, francamente, não importa. O cinema não precisa – e nem deve – espelhar as histórias em quadrinhos que o inspiram de forma literal. Capitão América: Guerra Civil tomou emprestado o título de uma série bem mais ou menos e usou seu conceito para criar um filme bem mais relevante. Podemos ver a mesma coisa acontecer sob o comando de Simon Kinberg, que parece ter escolhido um tom sombrio e austero para contar sua história. É uma boa escolha, já que o material pede uma abordagem menos colorida. Por outro lado, o clima de X-Men: Fênix Negra também parece refletir o clima sóbrio que marca definitivamente o fim de uma era. Não importa o resultado nas bilheterias, essa equipe de X-Men, essa narrativa nem sempre coerente esticada ao longo de quase duas décadas, não terá espaço no MCU, que provavelmente vai bolar uma nova maneira de reintroduzir os mutantes no cinema, do mesmo jeito que fez com o Homem-Aranha em Guerra Civil e em De Volta ao Lar. Talvez seja o caminho certo. E talvez eles consigam sair em grande estilo, apagando a decepção que foi Apocalipse, de 2016, e preparando o terreno para o epílogo da Marvel na Fox com Os Novos Mutantes em agosto. Rei morto, rei posto.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.