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“Inclusão não é sermão, e sim celebração”, diz diretor de Podres de Ricos

Roberto Sadovski

26/10/2018 02h46

Podres de Ricos é uma comédia romântica muito fofa. Mas vai além. É também a primeira produção de um estúdio americano encabeçada por um elenco asiático e uma protagonista asiática-americana desde O Clube da Felicidade e da Sorte, que Wayne Wang fez em 1993. Mas em nenhum momento o tema de inclusão e diversidade é abordado de maneira panfletária: a adaptação do best seller do escritor Kevin Kwan, que ganhou direção de Jon M. Chu (Justin Bibier: Never Say Never, G.I. Joe – Retaliação), é uma história sobre famílias, sobre amor, sobre aceitação e superação. Tudo isso, veja só, misturado em um caldeirão étnico que não ignora sua herança cultural, executado com a linguagem universal do humor. O resultado é um sucesso global de 232 milhões de dólares e mais um elemento na tapeçaria da representatividade que a arte – e o cinema em particular – vem tecendo ao longo dos anos.

"Pelos dois últimos meses, eu acho que tenho chorado a cada 36 horas", brinca Chu, diretor californiano de pais chineses, que conversou comigo quando seu filme já havia atingido status de fenômeno. "Tenho ouvido relatos de pais e avós que foram ao cinema e se emocionaram ao se enxergar no filme, e cada nova história é uma surpresa." O diretor ressalta o quanto representação é importante, mas que Podres de Ricos, no fim, não é apenas sobre isso. "A experiência que eu mostro no filme pode ser específica para a comunidade asiático americana, mas é um filme sobre a família", continua. "E quando famílias se encontram, não importa de qual parte do mundo, as experiências são similares. Embora todos sejamos diferentes, ainda somos todos humanos, e poder mostrar isso é a beleza do cinema!"

Michelle Yeoh, sem tigres agachados ou dragões escondidos

Podres de Ricos tem uma premissa simples. Rachel (Constante Wu) é apaixonada por Nick (Henry Golding). Ambos moram em Nova York, e ele a convida para um casamento em família em Singapura – mas "esquece" de mencionar que é herdeiro de uma das maiores fortunas do país. Logo ela vira alvo dos olhares maldosos (que enxergam uma aproveitadora), principalmente da matriarca Eleanor (Michelle Yeoh), mãe superprotetora de Nick. Risos e lágrimas se misturam, e a vida segue. "Eu queria abordar cada uma das histórias do livro", conta Chu, que escolheu como foco a jornada de Rachel para a Ásia. "No fim é sua história, quando ela descobre sua força e sua herança. É uma trama simples, o importante é modo como cada um a vivencia e o mundo erguido em torno dela."

Uma das maiores diferenças do filme em relação ao livro de Kwan é o tom. No papel, todas as situações eram exageradas e extravagantes, e Chu buscou equilibrar esse humor para manter a experiência mais realista. "O livro tem um espírito satírico, que eu queria preservar sem sacrificar a história que eu queria contar", continua. "Acertar o tom foi o maior desafio, e ter um elenco excepcional foi essencial para cumprir a missão: basta olhar para cada um deles e sabemos basicamente tudo que precisamos sobre seu personagem." A história de Rachel terminou, por mim, emoldurando um dos grandes temas do filme, que é a diferença cultural sobre a busca pela felicidade: "Nos Estados Unidos, ser feliz é questão de satisfação pessoal, ao passo que na China está atrelado aos sacrifícios que você faz por sua família e comunidade".

Jon M. Chu dirige seu elenco em uma mansão nababesca

A carreira eclética de Jon M. Chu é encarada por ele como um ensaio para realizar Podres de Ricos. "De uma forma muito estranha, acho que cada um de meus filmes contribuiu com parte da engrenagem", brinca. "A dança em Ela Dança, Eu Danço, a música dos trabalhos que fiz com Justin Bibier. Até a ação em G.I. Joe – Retaliação. Quem eu sou como artista e contador de histórias foi alimentado por esse mosaico de experiências." Não que ele esperava encontrar o sucesso com uma comédia romântica que, de certa forma, também o faz reencontrar a própria herança cultural: "O filme que me fez querer contar histórias e trabalhar com cinema foi Batman, de Tim Burton!".

O sucesso de Podres de Ricos pegou os estúdios de surpresa. "Ficou claro que o público quer se enxergar no cinema, por que a vida é assim", ressalta o diretor. "Inclusão no cinema pode ser algo divertido, não um sermão, mas uma celebração da vida." Ele aponta outros sucessos, como Corra! e Pantera Negra, como parte desse mesmo fenômeno, filmes que começam a sair do papel principalmente porque os executivos em Hollywood hoje são mais diversos que o estereótipo do sujeito branco, velho e rico. "Estamos vendo uma mistura de vozes e formas agora e o movimento é irrefreável", diz. "Precisamos representar melhor o mundo, e entender isso é o modo como o cinema vai sobreviver no futuro. Eu tenho muito orgulho de fazer parte disso"

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.