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Creed II segue a fórmula da série Rocky e entrega outro nocaute emocional

Roberto Sadovski

24/01/2019 04h27

É impossível fugir da sensação de deja vu com este Creed II, em que Michael B. Jordan e Sylvester Stallone entregam o que é definitivamente um exemplar da série Rocky. Depois de um começo surpreendente em 2015, quando o diretor Ryan Coogler voltou ao universo criado por Stallone quase quatro décadas antes e injetou emoção, modernidade e personagens bem desenhados em uma saga que parecia encerrada com Rocky Balboa, de 2006, o caminho mais lógico a seguir era abraçar a fórmula da série e continuar a jornada do novo boxeador. Creed examinou fundo temas como a busca pela identidade e o peso de um legado, sem desacelerar na injeção de adrenalina em combates brutais e emocionantes.

Creed II, por sua vez, não pretende ser um filme tão profundo. A missão do diretor Steven Caple Jr., que assume o lugar de Coogler, é jogar um tempero discreto e não se preocupar em trazer surpresas ou reviravoltas mirabolantes. O novo filme, na verdade, é uma salada com pitadas de Rocky III e, principalmente, IV, do qual surge como uma continuação direta. É um pouco decepcionante perceber que Adonis Creed, personagem defendido com fúria por Jordan, parece ter aprendido tão pouco depois de sua jornada no drama anterior: ele continua tendo necessidade de se provar para o mundo, e enxerga no que parece ser uma missão de vingança a oportunidade perfeita. Porque seu adversário desta vez é Viktor Drago (a montanha de músculos Florian Munteanu), filho do homem que matou seu pai no ringue tantos anos atrás. Com esse fiapo de trama, Creed II segue uma narrativa familiar, mesclando lições de vida e dramalhão pesado com combates eletrizante e tecnicamente perfeitos.

Drago filho e Drago pai tentam se livrar do peso do passado

Mas, quer saber? Funciona! Pode ser pela nostalgia, pode ser por nossa torcida eterna pelo azarão. Mas o fato é que Creed II sabe exatamente usar os clichês a seu favor, mesmo que a trama por vezes não faça o menor sentido. É aí que a herança dos filmes da série dirigidos por Stallone nos anos 80 ressoa pesado. Adonis enfrenta provações, físicas e psicológicas, impostas por ele mesmo. A soberba que causa sua derrota, o rompimento e reaproximação com Rocky, as cenas de treinamento em uma academia a céu aberto em pleno deserto (que não tem a menor lógica) – tudo remete aos melhores momentos dos filmes do "garanhão italiano" em seu auge. É surreal ver Stallone como mentor, desfilando sabedoria de boteco, sabendo que as posições eram invertidas anos atrás. Mas tudo isso faz parte do charme inegável de Creed II. Afinal, mesmo com o verniz dramático, e a condução por vezes documental, é evidente que estes filmes são uma fábula, uma fantasia, um conto de fadas destinado a colocar um espelho ante a platéia: se vocês aprenderem a levantar depois de cair, não há nada que vocês não possam fazer.

Não deixa de ser frustrante, entretanto, que o temível Ivan Drago (Dolph Lundgren) não tenha mais tempo em cena. Seu arco dramático, ao lado do filho criado para ser um matador nos ringues desde pequeno, é de longe a linha narrativa mais interessante do filme. O próprio Florian Munteanu, atleta e modelo que estréia aqui em um longa, traz uma tormenta por trás de seu olhar que convida o público a querer saber mais sobre suas frustrações, seus medos e sua necessidade quase patológica em agradar o pai. Talvez, ele acredita, uma vitória ganhe também o afeto de sua mãe, que abandonou a família após a derrota de Drago para Balboa numa União Soviética ainda mergulhada na Guerra Fria – Brigitte Nielsen, numa ponta piscou-perdeu, é a grande novidade aqui.

Stallone conduz Michael B. Jordan em um treino raiz

Mas o filme é de Michael B. Jordan. O ator, consagrado ano passado como o melhor e mais complexo vilão da Marvel no cinema em Pantera Negra, entende a oportunidade e a longevidade que um personagem como Creed oferece, e dá seu melhor. Espelhando a série Rocky, vemos Adonis aumentar sua família (Tessa Thompson é criminosamente mal aproveitada), manter um relacionamento turbulento com a mãe, enfrentar a sabedoria de Rocky (Stallone parece se despedir em definitivo de um de seus personagens-assinatura) e tentar ser uma pessoa melhor – ou ao menos mais completa. Creed II é, portanto, o filme necessário, embora não seja perfeito, para narrar essa evolução. E é fácil, muito fácil mesmo, relevar quaisquer pecadilhos quando os combatentes sobem ao ringue e aquele tema – que você sabe exatamente qual é – explode na escuridão do cinema. Vai dizer que já não está ouvindo….

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.