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Conan, o Bárbaro está de volta às bancas (e o mundo é um lugar melhor!)

Roberto Sadovski

17/09/2019 06h27

Eu tinha 9 anos de idade quando entrei no cinema, tantos e tantos anos atrás, para assistir a Conan, o Bárbaro. Podia? Não, não podia (a classificação indicativa era para maiores de 14 anos). Mas não havia força no planeta que me impedisse de ver o herói que eu acompanhava há pouco mais de um mês nos gibis materializado em carne, osso e músculos. No cinema, o Conan interpretado à perfeição por Arnold Schwarzenegger (demorei outros anos para aprender a pronunciar direitinho, e outros tantos para bater um papo com ele) era exatamente o que eu encontrava mensalmente em revistinhas como Heróis da TV e Superaventuras Marvel. Brutal, com um senso de lealdade inabalável, apaixonado por vinho, mulheres, pilhagem e resignado na fé em seu deus, o selvagem Crom. Por anos colecionar Conan se tornou um hábito que ajudou a moldar minha paixão pela fantasia e pelo gênero espada e feitiçaria que, perdoem-me fãs de O Senhor dos Anéis ou Game of Thrones, o bárbaro cimério ainda é o expoente máximo.

A boa notícia é que Conan volta às bancas em um par de publicações bimestrais: Conan, o Bárbaro e A Espada Selvagem de Conan, da Panini, ambas trazendo novo material editado nos EUA pela Marvel. A notícia ainda melhor é que justamente A Espada Selvagem de Conan, série clássica criada principalmente pela dupla Roy Thomas e John Buscema, será republicada na íntegra em uma coleção bacanuda, capa dura, lombada quadrada, apresentando a um novo público algumas das obras mais espetaculares da fantasia contemporânea – e deixando colecionadores que já entraram nos "enta" com um rombo considerável em seu orçamento doméstico no mínimo pelos próximos dois anos. É preciso, entretanto, ressaltar que o bárbaro nunca abandonou de fato as bancas, e vinha sendo publicado de maneira irregular, ainda que extremamente heroica, pela Mythos. Mas há tempos que o personagem não ganhava histórias inéditas da estatura do que vem sendo apresentado pela Marvel – depois que seus direitos ficaram por anos nas mãos de outra editora, a Dark Horse.

Conan em suas duas estreias no começo dos anos 80 pela Editora Abril

Minha história com Conan começou em junho de 1982, quando ele foi relançado para uma nova geração na edição 36 da revista Heróis da TV, que também trouxe com um trabalho editorial elegante aventuras de personagens da Marvel como Thor, Homem de Ferro, Surfista Prateado e Vingadores. O bárbaro, que foi criado em 1932 pelo escritor Robert E. Howard em contos publicados na antologia Weird Tales, foi o precurssor do gênero espada e feitiçaria com histórias brilhantes como "A Fênix e a Espada" e "A Torre do Elefante". Com o suicídio de Howard em 1936 (ele atirou na própria cabeça ao ser informado que sua mãe jamais sairia de um coma), Conan foi para uma espécie de limbo editorial, com histórias inacabadas surgindo esporadicamente nas décadas de 50 e 60. Foi em 1970 que a Marvel assumiu os direitos do personagem e o relançou já em título próprio, com textos de Howard adaptados por Roy Thomas e ilustrados por Barry Windsor-Smith. A série era diferente de tudo que a Marvel produzia, e logo o bárbaro ganhou um segundo título, A Espada Selvagem de Conan, em preto e branco e formato maior, que explorava de modo mais cru seu mundo de violência, sexo e fantasia.

No Brasil os quadrinhos do personagem chegaram em 1972, com três edições pela Minani & Cunha, seguida da edição "pirata" da Graúna (onde ele foi rebatizado "Hartan, o Bárbaro"), mais três edições pela Roval em 1973 e outras seis em 1976 pela Bloch. A chegada do bárbaro à Abril em 1982 coincidiu com o lançamento da aventura dirigida com John Milius e protagonizada por Arnold Schwarzenegger, que trouxe a reboque um interesse renovado em tudo que envolvia o personagem. E a Abril fez a festa, com almanaques, edições especiais, graphic novels e um punhado de histórias salpicadas por seus títulos de linha. Foram duas décadas na editora, que publicou mais de duzentas edições da Espada Selvagem até 2002, já no fim do contrato de licenciamento da Marvel. Com a mudança para a Dark Horse nos Estados Unidos, o selvagem também ganhou casa nova no Brasil: a Mythos começou sua saga com Conan em 2003 e até recentemente ainda editava suas aventuras em edições luxuosas esporádicas. A cereja no bolo dessa fase foram as edições escritas por Kurt Busiek e ilustradas por Cary Nord, que hoje são difíceis de ser encontradas.

As novas séries da Marvel mantém o espírito indomável do bárbaro

O novo fôlego de Conan surge com uma nova geração de artistas que cresceram acompanhando suas aventuras nos gibis da Marvel. Conan, o Bárbaro traz texto de Jason Aaron (Thor: Deus do TrovãoStar Wars) e arte de Mahmud Asrar (X-Men: Equipe Vermelha) e capas de Esad Ribic, em um primeiro arco de histórias que vai da juventude do bárbaro até seus dias como Rei da Aquilônia, emoldurando seu combate com a prole da Feiticeira Rubra. É um recomeço digno que reintroduz as crônicas do personagem com uma sensibilidade moderna, sem nunca perder o que faz de suas aventuras tão envolventes. Já A Espada Selvagem de Conan ganha tratamento gráfico mais caprichado para o time Gerry Dugan (Guerras Infinitas, Deadpool) e Ron Garney (Demolidor), com arte de Alex Ross nas capas, colocar o selvagem no mar, em histórias que não fogem de sexo e violência, às voltas com o maligno culto de Koga Thun (sério, só os títulos já me fazem abrir o sorrisão).

Voltar a acompanhar títulos mensais do bárbaro, saboreando novas histórias aos poucos, traz uma mistura de nostalgia e empolgação que, honestamente, estava bem difícil encontrar nas histórias em quadrinhos modernas. A coleção da Espada Selvagem clássica (com trabalhos de Roy Thomas, John Buscema, Barry Windson-Smith, Alfredo Alcala, Ernie Chan, Earl Norem, Joe Jusko e mais uma coleção de ícones modernos) já é um bônus bem vindo (e bem caro), que com os três livros com as histórias originais de Robert E. Howard, editados com capricho absurdo pela Pipoca & Nanquim, completa o renascimento de Conan para uma nova geração. Só assim essa turma vai aprender o melhor da vida: "Esmagar seus inimigos. Vê-los humilhados. E ouvir o lamento de suas mulheres".

Um fragmento elegante do relançamento do clássico A Espada Selvagem de Conan

Arnold Schwarzenegger como o Rei Conan porque sim

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.