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A Ascensão Skywalker: Não estamos preparados para o fim de Star Wars

Roberto Sadovski

22/10/2019 15h26

J.J. Abrams adora um mistério. Não seria diferente com Star Wars: A Ascensão Skywalker, que em pouco menos de dois meses encerra a saga criada por George Lucas num já distante 1977. O novo trailer do filme, último antes de seu lançamento em dezembro, aposta na emoção, na trilha grandiosa, e mantém a trama sob um véu de… mistério! É melhor assim. Sabemos que Rey e Kylo Ren vão resolver sua relação complicadíssima – seja como aliados, seja quebrando o pau em um duelo de sabres de luz. Sabemos que o imperador Palpatine, que todos acreditavam morto desde O Retorno de Jedi, pode ser o arquiteto da Primeira Ordem para sua volta ao poder na galáxia. Sabemos que os heróis vão se reunir em uma batalha derradeira pela liberdade. Sabemos de algumas coisas. Mas não sabemos de nada.

Desde que a Disney comprou a LucasFilm, Star Wars se tornou um animal diferente. O mais curioso é que essa última trilogia espelha a estrutura justamente da primeira, com uma história dividida em três atos distintos e complementares. Assim como em Guerra nas Estrelas (eu sou velho, julguem-me), O Despertar da Força trouxe um herói (ou heroina) improvável que se revela a grande esperança para derrubar um império totalitário do mal. Assim como em O Império Contra-Ataca, Os Últimos Jedi desafiou as expectativas e impôs uma derrota fulgurante a nossos heróis, questionou para qual lado pende a lealdade de seu maior vilão e terminou com um sentimento agridoce de vitória. Não é de se espantar, portanto, que A Ascensão Skywalker, assim como em O Retorno de Jedi, pareça apresentar escolhas quase impossíveis à sua protagonista – no teaser divulgado durante a D23, Rey surge com um ameaçador sabre de luz vermelho, insinuando que ela pode ao menos flertar com o Lado Negro da Força. Ter Lando Calrissian aparentemente liderando um grande ataque final aos vilões da aventura, ao mesmo tempo em que uma batalha mais intimista é travada na presença de Palpatine, só aumenta essa possibilidade.

Rey já está se debulhando em lágrimas por conta do fim de Star Wars

E é isso: possibilidades. É bobagem a essa altura rever o trailer com uma lupa em busca de "pistas" – um exercício de futilidade. Melhor mesmo é prestar atenção nas certezas. Uma delas é definitiva: Star Wars como conhecemos desde 1977 termina em dezembro. Não existe, em toda a história do cinema, empreitada mais bem sucedida em transformar a paixão por filmes em indústria. Nada arranha a importância da saga de George Lucas como inspiração para gerações que seguiram seus sonhos em criar magia com luz, som e imagens e movimento. Star Wars é muita coisa: filmes, acontecimento cultural, indústria bilionária, alvo de críticas. Por anos foi saco de pancadas de uma geração de "puristas" que enxergaram em filmes de estrutura simples, que espelham a jornada do herói, uma espécie de "anti-cinema", como se entretenimento fosse algo menor comparado a "arte" (seja lá o que essa turma defina como arte). Ainda assim, a paixão pela aventura e a empolgação em rever personagens icônicos colocou o público ao lado de Han, Luke, Leia, Obi-Wan, Rey, Kylo Ren e Darth Vader. É essa matemática que importa!

E é por isso também que Star Wars, como universo, continua sua expansão. A Ascensão Skywalker marca o fim de uma história ambientada nesse universo – que envolve os jogadores principais em um xadrez cósmico que mistura resistência a um regime ditatorial com misticismo à moda antiga. O espaço aberto por filmes como Rogue One e, agora, com The Mandalorian como série em streaming, mostra outras possibilidade a ser exploradas. A saga da família Skywalker, em torno da qual concentram-se os nove "episódios" no cinema, nunca foram ficção científica, assemelhando-se muito mais a histórias medievais, com seus castelos inexpugnáveis, heróis improváveis, duelos de espadas e cavaleiros defendendo diferentes lealdades. Rogue One, por sua vez, foi um filme de guerra explícito, uma aventura estilo "homens em uma missão" como Os Doze Condenados ou mesmo O Resgate do Soldado Ryan. The Mandalorian, ao que tudo indica, é mais western spaghetti com seu "herói sem nome" do que Star Trek. Planos para criar novas histórias neste universo, jogando luz em cantos até hoje inexplorados, continua nos planos da LucasFilm, seja no cinema (David Benioff e D.B Weiss, de Game of Thrones, estão desenvolvendo uma nova trilogia; Kevin Feige, da Marvel, vai produzir seu Star Wars; Rian Johnson, de Os Últimos Jedi, também está tocando novos filmes), seja no streaming (Ewan McGregor finalmente volta a esse universo como Obi-Wan Kenobi; Diego Luna retorna como Cassian Andor em uma aventura pré-Rogue One). O fim de Star Wars é, afinal, um recomeço para Star Wars.

A sala do trono de Palpatine precisa de uma mão de tinta

Precisamos de heróis. Star Wars, para gerações de apaixonados por aventura, fantasia e por cinema, foi o ponto de partida para um universo único, um lugar de sonhos e de inspiração. J.J. Abrams foi uma dessas pessoas, e transformou sua paixão em profissão ao se espelhar nas conquistas de Lucas e nas aventuras e personagens que ele criou. Para Abrams, A Ascensão Skywalker é uma oportunidade única em que um fã ganha as chaves do reino e a responsabilidade de encerrar a maior saga que o cinema já viu. "Quando você assistir aos nove filmes em sequência, vai perceber uma história coesa, uma saga única com começo, meio e fim", disse o diretor. O trailer dá a pista que a palavra de ordem foi mesmo emoção, foi criar uma celebração para os dos acontecimentos mais marcantes da cultura pop mundial. Lágrimas são opcionais, mas serão protagonistas dessa despedida, mais uma vez, agridoce. É o fôlego final para o começo do fim, e também a promessa de um recomeço. Afinal, o mundo seria um lugar terrível sem Star Wars. E ninguém quer viver em um lugar assim.

Adeus, amigos. E obrigado pelos peixes…

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.