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Como Rodrigo Santoro tornou-se o maior ator brasileiro no cinema mundial

Roberto Sadovski

19/08/2016 07h38

"Karl." Não aguentei e ri alto quando, na sessão para a imprensa da comédia romântica Simplesmente Amor, em Nova York, ouvi o nome do personagem de Rodrigo Santoro. O ano era 2003, e o ator, nascido em Petrópolis, Rio de Janeiro, há 40 anos, experimentava seus primeiros mergulhos como intérprete fora da terrinha. Ele havia trabalhado na refilmagem para a TV a cabo americana de Em Roma na Primavera (ao lado de Helen Mirren) e entrou mudo para sair calado de As Panteras Detonando, como um capanga da vilã Demi Moore. Simplesmente Amor seria seu primeiro papel com falas e função narrativa, sem servir apenas de decoração/paisagem. Mas "Karl" era difícil.

Eis que, treze anos depois, a carreira de Rodrigo Santoro segue em passos sólidos, firmando-se como o ator brasileiro mais bem sucedido no jogo do cinemão internacional. Em cartaz agora como Jesus Cristo na versão do russo Timur Bekmambetov para o clássico Ben-Hur, ele despe-se de estereótipos e dos conceitos geralmente atrelados a atores latinos que aportam em Hollywood – Antonio Banderas, com uma trajetória mais bem sucedida, ainda não se livrou desse estigma. O que Santoro conseguiu em pouco mais de uma década foi marcar território como intérprete de personagens que não dependem da origem de seu passaporte. A receita é uma só: talento e perserverança.

Bicho de Sete Cabeças

Traços que o acompanham desde que, rejeitado para um papel da minissérie da Rede Globo Sex Appeal, insistiu em sua vocação e foi escalado para o folhetim Olho por Olho. Daí ele aos poucos foi galgando os degraus dos galãs televisivos, com papéis de maior destaque até chegar à elite do canal. E ele podia seguir nessa linha confortável (como muitos já fazem), mas surpreendeu ao interpretar um frade seduzido por uma prostituta na minissérie Hilda Furacão. Definitivamente a telinha estava ficando pequena para a ambição saudável de Santoro, e em 2001 ele provou ser um ator de imenso talento ao arrancar aplausos em dois filmes difíceis, ancorados em seus ombros: Bicho de Sete Cabeças, de Laís Bodansky, e Abril Despedaçado, de Walter Salles.

Se em 2003 ele deu vida ao arquiteto Karl de Simplesmente Amor, foi também o ano em que Santoro deixou qualquer pudor de lado ao viver o travesti Lady Di de Carandiru, de Hector Babenco, ao mesmo tempo em que se despediu das novelas com Mulheres Apaixonadas (ele retornou à TV brasileira este ano em um papel breve na primeira fase da novela Velho Chico). Foi a deixa para ele colocar mala e prancha de surfe embaixo do braço e se mandar para Los Angeles, uma jogada de risco para consolidar sua carreira num canvas maior do que enxergava no Brasil. Deu certo, e logo Rodrigo se viu na megaprodução 300, como o deus-rei Xerxes, ao mesmo tempo em que entrava em Lost, série de TV que virou febre – mesmo que seu personagem, Paulo, tenha sido despachado em poucos episódios.

300

Dali em diante Rodrigo abraçou uma ponte aérea Los Angeles-Rio de Janeiro como rotina e foi otimizando seu talento com inteligência em filmes no Brasil e fora, alternando um cinema de vocação mais independente (O Golpista do Ano, Meu País, Reis e Ratos) com pedaços perfeitos de entretenimento (O Último Desafio, Recém Formada, Rio, Golpe Duplo). O ecletismo é refletido na cada vez menor profusão de papéis latinos, uma prova que o cinemão enxerga Santoro não como "um ator brasileiro", e sim como um ator intenso e dedicado, que dá o melhor de si, não importa o tamanho, a origem ou a nacionalidade do personagem. Na comédia O Que Esperar Quando Está Esperando, por exemplo, ele é Alex, marido de Jennifer Lopez, que é americano. "Não vejo preconceito, e sim o estereótipo", chegou a dizer. "Mas hoje o que chega em minhas mãos são personagens, não personagens latinos."

Claro que Jesus Cristo em Ben-Hur chegou como um tipo diferente de desafio. "Eu queria mostrar um aspecto que ainda não tivesse sido abordado nas diferentes versões que o cinema já havia apresentado", diz. "O que eu e Timur acordamos foi um Jesus que prega mais pelo exemplo do que pela palavra. Alguém que faz o que é certo, o bem, e não quem dá discursos sobre isso." Sobre a cena da crucificação, Rodrigo ressalta que foi uma de suas experiências mais intensas como ator. "Filmamos sem intervalos, comigo direto na cruz, em locação. Depois de uma noite de chiuva, muito frio e horas de maquiagem, nós no topo de uma colina e a cidade abaixo", lembrou o ator quando lançou Ben-Hur em São Paulo, não sem engasgar com genuína emoção durante a coletiva de imprensa. "Foi algo que eu jamais esquecerei."

Ben-Hur

Um longo caminho percorrido desde o Pedro de Olho no Olho, o Serginho de Explode Coração, o Neto de Bicho de Sete Cabeças, a Lady Di de Carandiru… E Karl. Cheguei a perguntar ao diretor de Simplesmente Amor, Richard Curtis, se o personagem de Santoro, com esse nome germânico, era brasileiro. "Claro que é", foi a resposta. "Não queria que ele tivesse nome de jogador de futebol", emendou, completando com ironia: "Quando você escrever seu filme, pode chamar o Rodrigo como você quiser." Ouch. Não que Rodrigo Santoro reclame. Ser o ator brasileiro de maior sucesso além de nossas fronteiras deve compensar.

Simplesmente Amor (Karl!!!)

 

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Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.