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O que aprendemos com a primeira imagem de Joaquin Phoenix como o Coringa

Roberto Sadovski

18/09/2018 06h07

"Arthur." Foi assim, enigmático, que o diretor Todd Philips revelou a primeira imagem de Joaquin Phoenix como o Coringa, no filme que chega aos cinemas em outubro do ano que vem. De cara, vamos tirar o óbvio da frente: NADA na imagem diz "Coringa". Nada de pele branca. Nada de cabelos verdes. Nada de sorriso perpétuo. Phoenix podia ser parte de uma continuação de Debi & Lóide, de uma refilmagem de Onde os Fracos Não Tem Vez. Qualquer outra coisa podia colar. Menos que ele está interpretando o arqui-inimigo do Batman em um novo filme. Mas este Coringa tem produção de Martin Scorsese. Robert De Niro está no elenco. E é Joaquin Phoenix! Impossível ignorar. Impossível não pensar "o que diabos a DC quer com tudo isso?"

A resposta é até simples: apertar o reset. O universo estendido DC, com seus super-heróis coexistindo em uma fórmula semelhante à da Marvel, fracassou. The Batman está em eterno desenvolvimento. Henry Cavill disse adeus ao Superman. A DC tem personagens espetaculares, e talvez traçar um plano totalmente fora da casinha faça efeito. Mesmo o último filme da, digamos, "primeira fase", parece acenar um novo caminho. Aquaman não deve ter laços com as aventuras anteriores dos heróis, assim como Shazam! ou Mulher-Maravilha 1984. Coringa definitivamente marca uma ruptura, um modo de o estúdio provar que não quer seguir os passos do rival – pelo contrário, que tem moral para arriscar como nunca!

Colocar o Palhaço do Crime como protagonista de sua própria história é, definitivamente, arriscado. Nos quadrinhos, existe um motivo para o Coringa não ter título próprio: o mistério sobre sua verdadeira natureza, e o completo caos inerente a cada nova interpretação, fez dele um personagem perfeito como coadjuvante, como gatilho para alavancar o arco dramático dos que o cercam – em especial o Batman. Fora dos quadrinhos, Heath Ledger construiu um Coringa perfeito em O Cavaleiro das Trevas, em que sua origem e suas motivações eram apresentadas de forma anárquica, imprevisível. Em outras palavras, ninguém precisa saber a origem do Coringa, porque o holofote nunca está sobre sua cabeça.

Romero, Nicholson, Ledger, Leto: cada Coringa é um novo Coringa

Em um ano, essa noção será virada ao avesso – o que pode ser ótimo! Fãs de quadrinhos são muito protecionistas com seus ícones. Mas a arte pode – e deve – ser reinterpretada quando um novo criador apresenta uma visão intrigante. A trama do filme de Todd Philips permanece um mistério, mas o estúdio descreve Coringa como "a exploração de um homem descartado pela sociedade, que não apenas é um estudo de personagem cru, mas também uma história que pode servir de lição". Nessa história, seguiremos a origem do adversário mais tenaz do Batman, acompanhando sua transformação de comediante de stand-up em uma força da natureza criminosa e absolutamente insana. Será um passo e tanto para o diretor de Se Beber, Não Case e Um Parto de Viagem, que aqui trabalha com um roteiro de Scott Silver (8 Mile, O Vencedor).

A verdade é que pouco importa se Coringa vai seguir alguma pista dos quadrinhos ou se vai traçar um caminho totalmente inédito para o personagem. Adaptar uma HQ (ou um livro, ou uma peça) é um trabalho de reinterpretação, e não necessariamente de tradução. Criado por Jerry Robinson há quase oito décadas, o Coringa já teve sua cota de reinvenções, nos quadrinhos e em outras mídias, o que não machucou sua essência. Nas mãos de Alan Moore e Brian Bolland, ele foi mostrado como um homem levado à insanidade pela perda e pelo desespero em A Piada Mortal. Ganhou nome e origem no Batman de Tim Burton, em que foi interpretado por Jack Nicholson como Jack Napier. Na série animada do Batman nos anos 80, teve voz de Mark Hamill e uma nova origem, retratada no longa A Máscara do Fantasma. Heath Ledger fez dele um sociopata anarquista. Jared Leto o transformou num gângster em Esquadrão Suicida. Todos foram diferentes. Todos eram o Coringa.

O que nos traz de volta a Joaquin Phoenix. Um dos atores mais interessantes de sua geração, Phoenix manteve-se longe desse estilo de cinema bombástico, preferindo trabalhar em projetos tão distintos quanto desafiadores como Sinais, A Vila (ambos de M. Night Shyamalan), Johnny & June (pelo qual ele foi indicado ao Oscar de melhor ator), O Mestre, Vício Inerente (ambos do genial Paul Thomas Anderson), Ela e o recente Você Nunca Esteve Realmente Aqui. Super-heróis? Nem a sombra, mesmo com a Marvel batendo em sua porta para ele assumir o protagonista de Doutor Estranho (que terminou com Benedict Cumberbatch). Coringa capturou sua atenção pela história desenvolvida por Philips e sua visão para o personagem. "Se é algo que pareça único, então eu não me importo com o gênero, não me importo com o orçamento, nada disso importa", disse em agosto ao IndieWire. "Meu interesse é explorar as pessoas. Não tem segredo, é simples pra car**lho, é química, é o que você procura em um amante. Quando acontece, a gente sabe." Sobre a pressão de abordar um personagem tão icônico, o ator foi categórico: "Eu não dou a mínima pro que os outros acham".

Arthur. O Hollywood Reporter  aponta que seu nome completo, antes de cair em desgraça, seria Arthur Fleck. A. Fleck. Fofo.

 

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Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.