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Bolão Oscar 2020: Tudo pronto para gabaritar a festa da Academia... ou não?

Roberto Sadovski

09/02/2020 05h58

Hoje é noite de Oscar! Ou seja, é noite de fazer um bolão esperto com os amigos e acompanhar os ricos e famosos se auto congratulando. Coisas que podemos esperar para a cerimônia: discursos politizados, choradeira generalizada, aplausos acalorados. É a primeira em muito tempo que todos os indicados ao prêmio máximo são filmes acima da média (ok, um é bacana porém superestimado…), e eu não lembro de outra cerimônia em que os concorrentes ao Oscar de atuação fossem certezas tão sólidas. Não só isso, é um Oscar em que todas as categorias tem um favorito absoluto, deixando a festa levemente previsível… pelo menos é a impressão geral. Mas será que é isso mesmo?

Calma lá, apressados! Embora exista uma certa previsibilidade, especialmente depois de um filme ter dominado os principais prêmios que antecedem a cerimônia da Academia (cofcof1917cofcof), o Oscar é historicamente palco de surpresas – nem sempre agradáveis. Afinal, é um mundo em que Hitchcock, Kubrick, Welles e Altman nunca ganharam a estatueta de melhor direção! O modorrento Crash deu uma rasteira em O Segredo de Brokeback Mountain! O insípido Shakespeare Apaixonado roubou o holofote de O Resgate do Soldado Ryan! Amy Adams ainda não tem um careca para chamar de seu! E, maior dos pecados, o farsante Roberto Benigni foi premiado como melhor ator (por basicamente interpretar a si mesmo no terrível A Vida É Bela) em um ano em que concorriam Edward Norton (A Outra História Americana), Tom Hanks (O Resgate do Soldado Ryan), Ian McKellen (Deuses e Monstros) e Nick Nolte (Temporada de Caça). Fala sério!

A verdade é que o Oscar 2020 pode fazer história. É possível que uma produção sul-coreana seja coroada como melhor filme (será?). É possível que um dos favoritos, com dez indicações, volte para casa com as mãos abanando (é contigo, Sr. Scorsese). É possível que o Brasil ganhe sua primeira estatueta, premiando uma diretora que capturou a agonia de uma democracia jovem (estamos na torcida). Alguns dos melhores trabalhos de 2019 sequer foram lembrados (Adam Sandler por Jóias Brutas, Jennifer Lopez por As Golpistas), deixando a festa levemente capenga. Ainda assim, o Oscar continua sendo a premiação mais importante do cinema mundial, um evento para o qual voltam-se os olhos da indústria e do público. Ao menos uma certeza: não teremos o sabor amargo de uma vitória tão mequetrefe quanto a de Green Book ano passado. Este ano, a vitória incontestável será do bom cinema!

1917

FILME
1917 é o filme a ser batido este ano. Foi premiado pelo sindicado de produtores, levou o Bafta e é o favorito. Mas não descarte em hipótese alguma uma vitória de Parasita, incontestável melhor filme de 2019 que tornou-se uma das produções mais festejadas em Hollywood nas últimas semanas. A simpatia pelo trabalho de Bong Joon-Ho é gigantesca, e seria histórico um filme em língua não-inglesa quebrar o molde do Oscar. Era Uma Vez em Hollywood, barbada até meados de novembro, continua uma produção querida, mas perdeu o fôlego. E Jojo Rabbit, vai saber, pode se beneficiar de votos conflitantes entre as primeiras opções dos membros da Academia. Quanto aos outros indicados, estão aqui para figuração.

DIRETOR
Se existe alguma incerteza quanto ao Oscar para 1917, o mesmo não pode ser dito sobre seu diretor. Sam Mendes cravou o prêmio do sindicato dos diretores e o Bafta, garantindo seu segundo Oscar (vai ficar na estante ao lado do prêmio por Beleza Americana). E será merecido, já que 1917 é, acima de tudo, um triunfo de direção e de fotografia. Agora, se ouvirmos o nome de Bong Joon-Ho (que fez um trabalho mais sólido que Mendes), tudo pode acontecer!

Renee Zellwegger em Judy

ATRIZ
Renee Zellwegger fez seu retorno triunfal como Judy Garland em Judy – e sabemos quanto Hollywood gosta de lamber suas crias. É um trabalho belíssimo em um filme só ok, mas Renee tem a simpatia de seus pares e ganhou tudo que podia com papel. Tudo bem que Charlize Theron teve uma interpretação mais sólida e redondinha em O Escândalo, e se o mundo fosse justo ela seria a vencedora. Mas vai ficar em meus sonhos – assim como a indicação que não veio para Lupita Nyong'o por Nós!

Joaquin Phoenix em Coringa

ATOR
Coringa existe unicamente por causa de Joaquin Phoenix e seu retrato fragmentado do Palhaço do Crime. Assim como Renee, o ator tem colecionado prêmio atrás de prêmio, então a única dúvida aqui é a forma com a qual ele deve conduzir seu discurso, já que ele alfinetou seus pares no Globo de Ouro e apontou o dedo para o racismo estrutural da indústria ao receber o Bafta. Falta alguém puxar o coro de "Are you Coringa?" na cerimônia. Ah, o melhor ator entre os indicados é Adam Driver, por História de Um Casamento. Viva com isso.

Laura Dern em História de Um Casamento

ATRIZ COADJUVANTE
O prêmio para Laura Dern, que fez a advogada mais raivosa do cinema em História de Um Casamento, é ao mesmo tempo merecido e um alô pelo conjunto da obra. Porque não é seu melhor trabalho. Mas talvez tenha chegado a hora de a atriz ter um Oscar para chamar de seu. Dito isso, Scarlett Johansson está indicada duplamente, e aqui uas chances são maiores. Dito isso, Florence Pugh é uma força da natureza em Adoráveis Mulheres! Dito isso, o que a Academia estava pensando ao não indicar Jennifer Lopez??!

Brad Pitt em Era Uma Vez em Hollywood

ATOR COADJUVANTE
Brad Pitt é o coração de Era Uma Vez em Hollywood, e dificilmente seremos privados de mais um discurso esperto – o que ele já entregou em outras cerimônias das quais saiu vencedor. Pitt é prata da casa e talvez seu Oscar tenha demorado um tanto – essa é sua terceira indicação. Al Pacino e Joe Pesci, ambos indicados por O Irlandês, devem canibalizar um ao outro. Anthony Hopkins é a banda menos saborosa da maçã de Dois Papas (Jonathan Pryce infelizmente trombou com o Coringa na categoria principal), e Tom Hanks não deixou queixos no chão como Mr. Rogers em Um Lindo Dia na Vizinhança.

Parasita

FILME INTERNACIONAL
Vamos combinar assim: se Dor e Glória ganhar aqui, já pode estourar os rojões por Parasita na categoria principal. Mas é mais provável que tenhamos uma repetição de Roma no ano passado. Podemos, ainda assim, sonhar…

LONGA EM ANIMAÇÃO
Toy Story 4 tem a simpatia de todos, e é um belo filme, mesmo sendo o quarto da série. Ainda assim, a Netflix caprichou na artilharia animada, e tanto Perdi Meu Corpo quanto Klaus seriam mais dignos do que a derradeira aventura dos brinquedos da Pixar. Não sei por que, mas algo me diz que o conto de Natal da Netflix vai surpreender geral.

ROTEIRO ORIGINAL
Noah Baumbach ganhou o Spirit Awards, o prêmio do cinema independente, por seu trabalho em História de Um Casamento, e pode surpreender aqui. Mas este Oscar deve estar com o nome de Bong Jooh Ho escrito desde que saiu do forno: nenhum texto em 2019 chega perto da complexidade e das camadas de Parasita. Jogo as mãos pro céu!

Jojo Rabbit

ROTEIRO ADAPTADO
Jojo Rabbit sai na frente, principalmente por já ter garantido o Bafta e o prêmio do sindicato dos roteiristas… E porque eu quero MUITO ver o discurso de Taika Waititi agradecendo a Academia por ter tirado sarro de Hitler, do Nazismo e de toda aquela baboseira de extrema direita. Mesmo assim, essa é uma categoria que eu ficaria contente com quaquer vitória. Menos se fosse Coringa

FOTOGRAFIA
Roger Deakins por 1917. Não discuta. Próximo.

MONTAGEM
Em Ford v Ferrari, o trabalho da dupla Michael McCusker e Andrew Buckland é tão vital para sua narrativa quanto a direção de James Mangold. As cenas na pista ganham outra dimensão, com as corridas arrumadas como um quebra-cabeças intrincado. Na verdade, o único indicado que parece deslocado é Thelma Schoonmaker: para muita gente, inclusive os votantes da Academia, O Irlandês simplesmente ficou longo demais.

Honeyland

DOCUMENTÁRIO
Talvez essa seja a categoria mais disputada do ano. For Sama sai em vantagem por ter levado o Bafta, mas existe muito amor por Indústria Americana (co-produzido pela Higher Ground, empresa do casal Barack e Michelle Obama) e pelo clautrofóbico The Cave. Ainda assim, minhas fichas vão para Honeyland, que é belíssimo e também está indicado a melhor filme internacional. Democracia em Vertigem, o excepcional documentário de Petra Costa, ganhou tração nos últimos dias com a diretora fazendo um tour pela mídia americana, mas talvez tenha sido pouco visto pelos votantes. Ainda assim, dedos cruzados!

DOCUMENTÁRIO CURTA-METRAGEM
O Oscar deve bisar o Bafta e premiar Learning to Skateboard in a Warzone (If You're a Girl).

CURTA-METRAGEM
Essas são as categorias que quebram o bolão de qualquer um! Brotherhood tem uma pegada política que fala ao zeitgeist, mas The Neighbor's Widow parece estar mais próximo da sensibilidade da Academia.

Hair Love

CURTA-METRAGEM EM ANIMAÇÃO
Hair Love é fofo, tem uma pegada contemporânea que contagia e, de todos, parece ter sido o que fez mais barulho.

FIGURINO
É clichê porque é real: a Academia adora premiar um filme de época, e Adoráveis Mulheres traz os predicados que historicamente desenharam essa categoria. Por outro lado, o figurino de Era Uma Vez em Hollywood, além de também ser "de época" (mais recente, me deixa), evoca uma Los Angeles que pode ganhar mais simpatia entre a Academia por pura nostalgia.

TRILHA SONORA
O segundo Oscar de Coringa provavelmente sairá daqui – e com justiça! A trilha escrita por Hildur Guðnadóttir ajuda a construir o clima desesperador em torno da performance de Joaquin Phoenix. Thomas Newman, por sua vez, emplacou sua décima-quinta (!) indicação por 1917, e não seria um Oscar injusto. Tiro no escuro: será que a Academia vai coroar a aposentadoria de John Williams com um prêmio por seu trabalho em Star Wars: A Ascensão Skywalker? Por favor, não…

Rocketman

CANÇÃO
Vamos aos fatos: não tem uma canção digna de duas patacas entre as cinco finalistas. "Into the Unknown", de Frozen 2? Só pode ser piada! "(I'm Gonna) Love Me Again", que a dupla Elton John e Bernie Taupin escreveu para Rocketman é a escolha mais simpática – e mais sensata! Mas não descarte Cynthia Erivo, protagonista do drama Harriet, que também empresta sua voz para a óbvia "Stand Up".

MIXAGEM DE SOM/EDIÇÃO DE SOM
Duas estatuetas, dois prêmios para 1917… dois Oscar que ficariam muito mais bacanas na conta de Ford v Ferrari.

Adoráveis Mulheres

DESENHO DE PRODUÇÃO
De longe, os dois melhores trabalhos nessa categoria pertencem a 1917 (o passeio pela França ocupada durante a Primeira Guerra Mundial é um assombro) e a Parasita (todo rodado em estúdio, com a casa principal sendo uma pérola do design, surgindo quase como um personagem). Mas será que o fator nostalgia daria vantagem a Era Uma Vez em Hollywood e sua reconstrução de uma Los Angeles em transformação artística e cultural? Hmmm…

MAQUIAGEM
O trabalho de Kazu Hiro, Anne Morgan e Vivian Baker ao transformar Charlize Theron na jornalista Megyn Kelly em O Escândalo é de cair o queixo, e de longe joga uma sombra na concorrência. Só Coringa pode puxar o tapete – talvez em solidariedade pela equipe traumatizada por Joaquin Phoenix.

EFEITOS VISUAIS
Ano passado eu apostei em Vingadores: Guerra Infinita e levei um caldo de O Primeiro Homem. Este ano vou apostar em Vingadores: Ultimato, pronto para uma granada de 1917 explodir minhas expectativas. Pergunta: O Irlandês seria um concorrente sério? As respostas, meus caros, teremos em algumas horas. Preparem-se!

Vingadores: Ultimato

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Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.