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Os 5 erros de Batman vs Superman – e como consertá-los para o futuro da DC

Roberto Sadovski

29/03/2016 00h08

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Batman vs. Superman: A Origem da Justiça chegou aos cinemas batendo recordes nas bilheterias. Vamos aos números? Foram 420 milhões de dólares arrecadados em todo o mundo em sua estreia, tornando-se a maior abetura de um filme em março e a maior estreia de um filme da DC Comics (atropelando os números de O Cavaleiro das Trevas Ressurge). Sétima maior estreia da história nos Estados Unidos – e a quarta entre filmes de super-heróis, comendo poeira para os dois Vingadores e para o terceiro Homem de Ferro. Ah, e foi também a melhor estreia de um filme massacrado pela crítica: tem, neste momento, 29 por cento de aprovação no Rotten Tomatoes e 44 no Metacritic. O público, apesar dos números, também não se animou, cravando um "B" pelo CinemaScore, que mede a aprovação da platéia – mesmo patamar de Lanterna Verde e Mulher-Gato. As próximas semanas serão decisivas para Batman vs Superman – e para o futuro da DC no cinema em geral.

Com Esquadrão Suicida chegando aos cinemas em agosto, e Mulher-Maravilha estreando ano que vem, ao lado de Liga da Justiça, o Universo Expandido DC parece tomar forma. Felizmente, ainda há tempo para corrigir os tropeços inacreditáveis de Batman vs Superman, um filme tão mais ou menos que aniquila a ansiedade em ver os outros heróis da editora tomar forma na tela grande. Ao menos Esquadrão Suicida parece se levar menos a sério e apostar igualmente em intensidade e humor – o segundo trailer do filme é mais empolgante que as duas horas e meia de BvS. Como eu sou bacana, aponto alguns erros que a DC comete no filme e um caminho para deixar a máquina funcionando sem ranger. Ao menos o sucesso da aventura nas bilheterias garante a continuidade do projeto. Ser um filme ruim, afinal, nem é um pecado para quem ouve o tilintar das caixas registradoras: Transformers – Era da Extinção, afinal, faturou 1 bilhão de dólares.

Ah, daqui para a frente é território de spoilers pesados de Batman vs Superman! Se você ainda não viu o filme, clique aqui e aqui, e depois a gente conversa!

MAIS BATMAN, MENOS SUPERMAN

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Há pelo menos dois anos, quando Ben Affleck foi escolhido para ser o novo Batman, a internet quebrou. Eu chutei que ele poderia ser o melhor Cavaleiro das Trevas do cinema – e não estava errado! Trazendo um bom equilíbrio entre cérebro e massa bruta, o Batman de Affleck é brutal e dá o recado, plantando o terror no coração dos bandidos. Pena que a) ele precise de um filme decente para brilhar e b) tenha surgido tão descaracterizado, já que é ludibriado facilmente por Lex Luthor e, muitas vezes, comporta-se como um moleque birrento, e não como o sujeito que usa inteligência para derrotar até o mais tenaz dos adversários. O recado é claro: o estúdio precisa apressar um filme-solo do Batman, mas com Affleck no comando – é o que o ator provavelmente está preparando com o roteirista Geoff Johns.

O Superman, por outro lado, só é identificado como o Homem de Aço por conta do símbolo em seu peito. Em teoria, ele representa a luz, contrapondo-se às trevas invocadas pelo Batman. Em BvS, porém, o herói surge resignado, carregando um peso difícil de identificar – ou compreender. Quando o Superman entra em ação no mundo criado por Zack Snyder, parece um fardo, uma maldição, uma obrigação… Nunca é uma ação por altruísmo. Cabisbaixo, soturno e anos-luz do super-herói que serve de exemplo a todos os outros, ele nunca cumpre a promessa fincada em O Homem de Aço: a de ser um símbolo de esperança. Na visão de Zack Snyder, Superman se tornou o verdadeiro Cavaleiro das Trevas. O que nos leva ao próximo problema….

ZACK SNYDER PRECISA DESCANSAR

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A Warner/DC entregou as chaves do reino a Zack Snyder, e ele disparou um ótimo ponto de partida com O Homem de Aço. Apesar das falhas do filme que reapresentou Kal-El nos cinemas depois do malfadado Superman – O Retorno, ao menos trazia uma visão moderna do impacto do surgimento de um verdadeiro semideus no mundo moderno. Batman vs Superman, por outro lado, o traz como um esteta competente, mas incapaz de entregar uma obra apaixonada e apaixonante. O resultado é uma colcha de retalhos, nunca um filme coerente. Snyder, em entrevistas recentes, prova que não tem o pulso leve para conduzir uma adaptação de histórias em quadrinhos. 300 e Watchmen são experiências estéticas de censura alta; Batman vs Superman deveria ser a celebração do encontro dos maiores super-heróis dos quadrinhos. O que ele entregou, entretanto, foi um filme seco, desprovido de coração, com zero leveza ou senso de humor. Um erro, já que, no frigir dos ovos, o assunto é entretenimento para a molecada, para adultos, para fãs e não fãs – e não para meia-dúzia de nerds que acredita estar abraçando um filme "adulto" e "realista". Snyder, obviamente, não é o sujeito certo para o trabalho.

O que me faz temer pelo futuro de Liga da Justiça. Uma reunião de super-heróis pode ter o subtexto que for, mas ainda é uma aventura de seres poderosos com trajes coloridos. É a luta do bem contra o mal, é algo para servir de inspiração, não de introspecção. A maior diferença dos heróis da Marvel e da DC foi sempre essa: a Marvel surgiu nos anos 60 como um espelho de uma sociedade quebrada, no calor da contra cultura, da Guerra do Vietnã, da liberação sexual, do fim do sonho americano: mostrava o homem e o super-homem cheio de falhas. A DC, por outro lado, surgiu em meio à Segunda Guerra Mundial, num mundo com poucos tons de cinza, e seus heróis eram semideuses, o pináculo da perfeição humana, uma inspiração. E isso não rima com mundos sombrios e heróis carregados de incertezas. Snyder foi perfeito para 300. Perfeito para Watchmen. Mas sua mão é pesada para traçar o mundo que a DC precisa no cinema. Será que dá tempo de mudar o diretor de Liga da Justiça? Alguém pelos estúdios da Warner ainda tem o telefone de George Miller?

NÃO TENHA PRESSA EM CONSTRUIR SEU UNIVERSO

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Fanboys detestam comparações, mas fanboys também demoram para enxergar além do óbvio: a Marvel criou um modelo perfeito para executar um universo compartilhado no cinema. Mais óbvia ainda é a própria fórmula: confiar em seus personagens, não consertar o que não está quebrado, dar tempo para a plateia conhecer os jogadores antes de espalhar as peças no tabuleiro. A DC, pelo visto, tem pressa. Batman vs Superman nunca tem tempo de se impor como filme, parecendo um prólogo de todo o universo que está por vir. Bruce Wayne, por exemplo, tem um pesadelo em que o Superman é um déspota (ou algo parecido), em uma sequência que sugere a presença do megavilão Darkseid, com o símbolo do Ômega talhado na Terra, as fossas em chamas que tomam o planeta e os parademônios que acompanham soldados do Homem de Aço. Se essa sequência fosse limada, em nada atrapalharia a trama do filme. Pior: ela apetece unicamente aos fãs mais hardcore, não fazendo o menor sentido para os não-iniciados.

Tudo em BvS, portanto, serve como pista para o que está por vir – mesmo que o roteiro nunca se dê o trabalho de deixar isso claro. Lex Luthor cria o monstro Apocalypse aparentemente sem o menor motivo. Entretanto, uma cena deletada do filme, liberada online antes de o filme estar uma semana em cartaz (cenas inéditas, vale lembrar, surgem pouco antes do lançamento em home entertainment…), sugere que existem forças externas influenciando Luthor – esse bonitão na foto acima parece um dos acólitos de Darkseid, mostrando a Lex três "caixas maternas", revelando um elemento alienígena na criação do Apocalypse. Por que não guardar isso para um filme futuro? Se era importante, por que então cortar de BvS? Quando o vilão é desmascarado e aprisionado, ele diz ao Batman que "algo" está a caminho… e só resta à plateia engolir a poscadela sem entender nada. O subplot envolvendo a Mulher-Maravilha é ainda pior, já que sua participação concentra-se em recuperar uma imagem nos arquivos de Luthor – quando revelada, a foto traz o elenco do filme da Guerreira Amazona, ambientado durante a Primeira Guerra Mundial, mas sem o menor contexto. Só faltou um "Mulher-Maravilha, julho de 2017, nos cinemas!" pintando em cena. O que nos leva ao problema seguinte…

CINEMA É IMAGEM; SUPER-HERÓIS SÃO ICÔNICOS!

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Em uma narrativa audiovisual, apresentação é tudo. Quando o assunto são super-heróis, seres maiores que a vida, o modo de apresentá-los é extremamente importante. São aqueles momentos em que a plateia levanta-se, aplaude, grita, abraça o filme. É como o surgimento da Millenium Falcon em Star Wars: O Despertar da Força. É como a primeira vez que Tony Stark usa uma armadura, surgindo de uma caverna em Homem de Ferro. É Sean Connery acendendo um cigarro acompanhado de um "Bond… James Bond"! O Homem de Aço fez um trabalho decente em reintroduzir o Superman com um estrondo. Em BvS, porém, Zack Snyder tem um ótimo ator no papel do Cavaleiro das Trevas, usando o traje mais perfeito já criado para o cinema, com um visual incrível… e ele escolhe mostrar o Batman primeiro fora de foco, depois borrado dentro do batmóvel. Por que caprichar tanto no visual se não há intenção em tornar sua apresentação um momento memorável?

Pior destino tem o resto da Liga da Justiça. Alardeados como pontas cruciais no filme, os super-heróis de filmes futuros Flash, Cyborg e Aquaman são mostrados… em arquivos de computador! Num mp4 de quinta! Num laptop com videos surrupiados pelo Batman! É de dar vergonha, é um desserviço ao grande plano que a DC tem em criar um universo de super-heróis coeso. Se Batman vs Superman tinha de ser "A Origem da Justiça", por que não fazer com que os heróis surgissem no final, como uma equipe, combatendo Apocalypse? Funcionou para a Mulher-Maravilha – que, por sinal, surge num momento bacana, icônico, como uma guerreira calejada em matar monstros. Justamente por isso é uma das melhores cenas do filme!

SE VOCÊ TEM SURPRESAS, GUARDE-AS PARA O FINAL… DE PREFERÊNCIA, DEPOIS DE CONTAR SEU FILME!

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Homem de Ferro termina com Tony Stark assumindo que é o homem atrás da armadura. Depois dos créditos, Samuel Jackson surgiu como Nick Fury, sugerindo que o universo era bem maior do que havíamos acabado de ver. Em nenhum momento, porém, a ideia de criar um teia de filmes coesa atrapalhou a história do filme. A única vez que isso aconteceu na Marvel foi em Homem de Ferro 2, que gastou metade de sua trama gritando "ei, temos mais heróis no bolso, logo juntaremos todos!". Não é à toa que é o filme menos festejado da Marvel. Do lado da DC, mais especificamente em Batman vs Superman, a trama do filme está em segundo lugar, abrindo espaço para a necessidade em explicitar que este é o primeiro (ou segundo…) filme de um universo maior. Se existe uma única pista que eles podiam copiar da concorrência na cara dura, é justamente não apressar as coisas.

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A esperança é que Esquadrão Suicida e Mulher-Maravilha, os próximos na linha de montagem, sejam tramas redondas e contidas, sem precisar de uma bula para ser compreendidos. É a chance que a DC/Warner tem em salvar seu Universo Expandido e criar, com o tempo, uma rede de filmes que conversam entre si, mas que funcionam como entidades autônomas. Batman vs Superman, por mais grana que renda, foi um ponto de partida capenga e prejudicial ao plano a longo prazo. Os arquitetos da DC no cinema precisam sambar para fazer com que todas as pontas soltas se amarrem em torno de seus próximos filmes. Liga da Justiça, honestamente, será lançado cedo demais, sem tempo de respiro – e já chega aos cinemas tendo de resolver o problema da morte do Superman em BvS. Nada pior, portanto, do que um filme que não conclui sua própria história. O público não quer um "a seguir, cenas dos próximos capítulos", e sim um filme redondo, emocionante e espetacular, que o deixa com vontade de ver mais… E não que seja obrigado a isso para ver como a história termina.

 

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.