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Arranha-Céu consagra Dwayne Johnson como rei do cinema de ação descartável

Roberto Sadovski

11/07/2018 15h19

Não existe nada em Arranha-Céu – Coragem Sem Limite, que você não tenha visto antes. Ou que você não tenha visto no trailer do filme. Alguns anos atrás, a nova aventura com o fortão boa-praça Dwayne Johnson seria exatamente o tipo de espetáculo que deixaria a platéia eletrizada na temporada mais lucrativa do cinemão ianque: um astro carregando um conceito de história nas costas, tudo emoldurado com a melhor pirotecnia que Hollywood pode pagar. Hoje, com as bilheterias dominadas por super-heróis, continuações bombásticas e filmes-evento milionários, esse tipo de cinema surge como um anacronismo. Assim como as comédias românticas, é um estilo que soa ultrapassado, mas que garante seus trocados unicamente pelo carisma de seu protagonista. E é um filme que foge da memória segundos depois de as luzes se acenderem.

Dwayne Johnson, hoje, é possivelmente único herdeiro desse tipo de cinema, que décadas atrás construiu a carreira do trio Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone e Bruce Willis. Ele tem presença cênica inegável, charme aos baldes e um magnetismo que vai além do público óbvio para o tipo de filme que faz. Quando se aventura fora dessa caixa, consegue ótimos resultados, como o recente reboot de Jumanji, um colosso de quase 1 bilhão de dólares. Em sua zona de conforto, porém, Johnson, que um dia respondeu pelo imponente apelido The Rock, abraça um cinema explosivo e raso como um pires, em que as variações narrativas são apenas desculpas para ele, em graus diferentes, enaltecer a família, quebrar os vilões e salvar o mundo. Foi assim desde seu primeiro filme como protagonista, Bem Vindo à Selva, lançado depois da dose dupla que o introduziu ao cinema, O Retorno da Múmia e O Escorpião-Rei. Em sólidos dezessete anos de carreira, em que foi para o topo da lista de atores mais bem pagos, ele mostrou que aprendeu com os passos de seus antecessores.

Dwayne Johnson e Neve Campbell são um casal feliz num lugar nem tanto

O mais óbvio é Schwarzenegger. Depois de um começo cauteloso, o gigante austríaco ganhou o planeta em Conan, O Bárbaro, e equilibrou filmes que o colocavam levemente fora da caixinha genérica do gênero de ação e diversificou seu eleitorado. Fez comédia (Irmãos Gêmeos), aventura para toda a família (Um Tira no Jardim de Infância), ficção científica (O Predador) e até filmes de super-heróis (Batman & Robin). Soube trabalhar sua marca como ninguém, ancorando ao menos um clássico irrefutável: O Exterminador do Futuro 2. Em meio a isso tudo, porém, trabalhou em filmes de ação descartáveis construídos em torno de sua persona, de Comando Para Matar a Queima de Arquivo, passando por Jogo Bruto, Inferno Vermelho, Efeito Colateral… e quase tudo que ele fez depois de deixar o posto de governador da Califórnia.

Uma espiada na carreira de Dwayne Johnson basta para traçar todos os paralelos possíveis – com a adição do título de "salvador de séries cambaleantes". Ele trocou de lugar com Brendan Fraser em Viagem 2 – A Ilha Misteriosa, mudou a direção de G.I. Joe – Retaliação (sem muito sucesso, diga-se) e injetou adrenalina pura na trôpega Velozes & Furiosos, a ponto de ganhar um spin off para chamar de seu – Hobbs and Shaw, com Jason Statham, logo vai para a frente das câmeras. A seu favor, Johnson traz uma vontade genuína de ciscar em outros quintais, tentando expandir seus limites como artista. Foi assim no equivocado Southland Tales, em que ele abandonou de vez o apelido The Rock; foi assim como coadjuvante no apático Be Cool; foi assim no esquisito Sem Dor, Sem Ganho, em que o próprio Michael Bay, responsável pelo filme, arriscava uma direção diferente.

O astro é orientado pelo diretor Rawson Marshall Thurber

Arranha-Céu, porém, não possui nenhuma ambição além de ser exatamente o que aparenta: um filme de ação genérico, em que Johnson arrisca um resgate impossível e enfrenta vilões de plástico, salvando sua família no processo. Ele é Will Sawyer, agente do FBI aposentado (ele perdeu uma perna numa missão mal sucedida) contratado para avaliar o sistema de segurança da Pérola, maior edifício do planeta, inaugurado por um bilionário da tecnologia em Hong Kong. Vilões querem algo dentro do prédio, capangas ainda mais genéricos incendeiam o lugar e cabe a Sawyer/Johnson salvar o dia. Se parece uma mistura de Duro de Matar com Inferno na Torre, é exatamente isso, mas sem uma fração de seu charme. Falta a Rawson Marshall Thurber, que dirigiu o astro em Um Espião em Meio, personalidade para construir uma aventura que possa resistir à ação do tempo. Mas talvez nem fosse essa a intenção. Como parte da construção da marca Dwayne Johnson, a coisa toda funciona. Mas, em pleno século 21, o cinemão exige mais. E o astro definitivamente pode fazer melhor.

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.